sexta-feira, 10 de abril de 2009

O Crime

Há 91 anos os soldados e sargentos que se encontravam nas trincheiras da Flandres, desataram a correr assim que viram os soldados do Exército Imperial Alemão a meio da terra de ninguém. Os seus oficiais, aqueles que ainda não haviam desertado a coberto de uma qualquer licença, já haviam há muito abandonado os seus confortáveis quartéis.
Para trás ficaram 7 000 baixas, entre mortos, feridos e prisioneiros. Ao fim do dia apenas restou a vergonha de todo um corpo de exército relegado para trabalhos braçais na retaguarda até ao dia 11 de Novembro.
O desastre de La lys não foi nenhuma novidade. Estava anunciado havia muito. Mais precisamente desde que, em 1916 o governo de Afonso Costa, acossado por todos os lados, declara guerra à Alemanha, na tentativa de inventar um inimigo externo que desviasse as atenções dos problemas internos.
Nesse dia ficou traçado o destino de milhares de Portugueses.
Um exército depauperado, comandado por oficiais incompetentes, cuja promoção dependia das simpatias políticas, iniciou em Tancos uma preparação para uma guerra inexistente, chamada pomposamente de "Milagre de Tancos". Esse "Milagre", vendido pelos jacobinos republicanos à opinião pública, como os milagres da Igreja do Reino de Deus, terminou assim que os membros do Corpo Expedicionário Português (CEP), cheios de Febre Tifóide desembarcaram em Brest, obrigando os aliados a confiná-los em quarentena afim de evitar uma epidemia catastrófica. O horror do aliados aumentou ainda mais, quando descobriram que todos os militares dos regimentos de metralhadoras, desconheciam em absoluto o funcionamento da metralhadora Lewis, o padrão dos aliados, e que os artilheiros ficavam embasbacados com a visão de uma peça de grande calibre.
Nos campos da Flandres teve de ser realizado novamente e a partir do zero, o treino para a guerra de trincheiras.
Sem meios para assistir o exército em França (Portugal apenas tinha dois velhos navios de transporte e nenhum de escolta), e dependente da boa vontade e paciência Britânica, o CEP ficou entregue à sua sorte, sem material nem reforços assim que começou o transporte do exército Norte-Americano para a Europa, fazendo com que os pobres praças Portugueses apodrecessem na lama e frio das trincheiras durante oito meses, quando os seus aliados e inimigos realizavam turnos de 30 dias.
Os oficias, esses, estiveram sempre bem instalados, atrás de secretárias, sempre com licenças para passeatas em Paris-Plage. Aqueles com boas ligações políticas conseguiam uma licença para visitar a familia em Portugal, o que sempre significava uma viagem de ida sem volta.
Não admira por isso que, na madrugada de 9 de Abril de 1918, os praças Portugueses tenham atirado as espingardas para o chão, e fugido.
Foi a corrida pelas suas vidas.
Foi a única coisa honesta que podiam ter feito.
Fugir a sete pés era a única coisa que uma República, que pouco ou nada se importou com eles, merecia.

15 comentários:

Nuno Castelo-Branco disse...

Mas as loas que se tecem ainda hoje à desastrosa participação - a maior derrota de uma completa campanha -, servem para escamotear a criminosa incompetência. E pasmemos, era exactamente o mesmo exército português que em 1905 impressionara o imperador alemão de visita a Lisboa. O mesmo, de nome apenas, porque a realidade já era outra.

Anónimo disse...

Caro Luís,

Apesar de concordar com alguma da informação aqui apresentada, parece-me pouco sensata a utilização de algum vocabulário presente neste artigo. Na verdade, o tratamento a que foi sujeito o CEP é inaceitável: falta de preparação, formação de oficiais de fraca qualidade, falta de meios logísticos, etc. Contudo, teremos que ver o aspecto político deste acontecimento, que tem origem na defesa das integridade territorial das nossas colónias, projecto abraçado pelos governos monárquicos dos finais do século XIX que sublinhou o período glorioso do Exército Português. Outro aspecto pertinente, seria a defesa da soberania nacional, ameaçada por uma Espanha de Afonso XIII combinada com a Inglaterra. De facto, à parte a carnificina humana, a presença militar portuguesa no primeiro conflito mundial foi uma necessidade em que resultaram algumas vitórias políticas.

Cumprimentos,

Jt

Anónimo disse...

Caro Luís,

No meu último comentário por lapso, faltou uma alusão ao episódio da Batalha de La Lys que tanta polémica suscita entre muitos curiosos.
A batalha de La Lys não durou só um dia. As operações militares terminaram só no dia 24 de Abril. De facto, a escolha do sector a atacar, foi minuciosa. Essa escolha recaiu sobre o sector português. No dia 08 de Abril de 1918, o sector português teria ficado sem uma parte dos seus efectivos, uma vez que, teriam sido transferidos para a retaguarda na espera de novos reforços. Seria demasiado tarde, os alemães atacariam em força, com 120 mil homens. Os portugueses teriam no seu sector cerca de 20 mil homens, pouco ou nada poderiam fazer. Contudo, a vaga foi sustida com muita dificuldade pelas forças britânicas, o que justifica o que alguns especialistas defendem: independentemente de quem pertencesse o sector atacado, este teria dificuldade em suster tal vaga humana e bélica.

Espero ter sido esclarecedor.

Cumprimentos,

JT

Luís Bonifácio disse...

Discordo frontalmente com a velha desculpa dos territórios ultramarinos, pois desde 1914 se "combatia" (Na realidade os Portugueses morriam de doenças e exaustão e ocasionalmente de combate), sem que houvesse qualquer "declaração de Guerra".
Nunca os Ingleses (Conhecedores do estado do exército) quiseram a nossa presença na Flandres.

Quando Afonso Costa se fez convidade, atribuiram-nos um sector que estava "parado" desde Setembro de 1914. Exactamente o sector onde se realizavam confratenizações com jogos de Futebol no dia de Natal entre Ingleses e Alemães. A ideia inglesa era exactamente fazer com que não disparassemosum tiro.

O episódio mais triste da nossa participação foi o bombardeamento unilateral Português contra os alemães na noite de natal de 1917, sendo este o únicoano onde não se jogou futebolnos campos de La Couture.

Anónimo disse...

Sr. Bonifácio,


A "desculpa" dos territórios ultramarinos é a mais real. É verdade que os britânicos não queriam a nossa presença no conflito. E sabe-se, que os portugueses mesmo antes de entrar "oficialmente" no conflito, já defendiam as suas fronteiras face aos ataques alemães. Existem provas documentais desses ataques.Em guerra, a humanidade desumanisa-se, é recorrente a existência dos episódios que mencionou.

Anónimo disse...

Caro Luís,


Parece também ser um pouco apanágio deste espaço denegrir a figura de Afonso Costa. O que se pode atestar pelo seu último comentário. O projecto da participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial foi obra de inúmeros diplomatas entre os quais Teixeira Gomes ou o próprio António José de Almeida. Há um desperdício de energias a criticar Afonso Costa, e diminuir a República somente a esta figura histórica, será bastante redutor.

Cumprimentos,

JT

Nuno Castelo-Branco disse...

Caro JT. Quem reduziu a dita república foram os próprios alegados republicanos. Para isso, basta ler o que eles diziam do regime e dos seus chefes, entre os quais o A. Costa era sem dúvida o mais citado.
O que se torna verdadeiramente espantoso, é o argumento da aliança com a Inglaterra, quando o prp passou mais de duas décadas a insultar a dinastia - diga-se o Estado - por essa ligação, tudo aproveitando para chamar "traidor e vendido" ao rei e ao regime no seu todo. Após o regicídio e farejando a oportunidade do poder, tornaram-se de uma total subserviência para com os ingleses, situação que apenas seria alterada nos anos trinta, quando o declínio do poderio de britânico ofereceu uma excelente oportunidade para pôr cobro aos abusos e intromissões na nossa soberania, especialmente em Moçambique e nas companhias (telefones, gás, electricidade e transportes) em Portugal continental. As cartas e memorandos do sr. Teixeira Gomes são absolutamente patéticas para um diplomata, denotando por vezes aspectos bastantes mesquinhos, obcecado pela perseguição movida a D. Manuel (e Augusta Vitória) que foi o grande agente português junto do governo de Londres e do rei Jorge V. A história acaba sempre por descobrir a verdade. JT, aquela gente não prestava e transtornou todo o nosso século XX. Infelizmente.

Nota: na parada da Vitória após a I Guerra Mundial, quem surge ao lado de Jorge V e da rainha Mary, são D. Manuel II e Augusta Vitória. Por onde andaria o sr. Teixeira Gomes?

Reuser disse...

Caro Nuno, foi brilhante, parabéns

Ricardo Pinheiro Alves disse...

Caro Nuno Castelo-Branco,

Pareabéns pelo "post". A desculpa das colónias continua a imperar. Havia realmente o perigo de Portugal perder colónias. Mas já estávamos em guerra com a Alemanha muito tempo antes da desastrosa participação na I GG na Europa. Seria possível defendermos os nossos interesses sem particopar na I GG? Claro, se os "famosos" diplomatas Teixeira Gomes e outros soubessem fazer o seu trabalho. Se os esforços de Portugal no combate à Alemanha se concentrassem em Àfrica e não na desgraçada La Lys. Bastaria negociar. O problema é que o regime republicano não era credivel em lado nenhum pelo que os republicanos não tiveram outra alternativa senão sacrificar portugueses, contra a vontade do próprio exército, para afirmarem a sua utopia internacionalmente. Mais uma irresponsabilidade do regime que o povo português pagou com sangue, suor e lágrimas.

João Amorim disse...

caro JT

"à parte a carnificina humana, a presença militar portuguesa no primeiro conflito mundial foi uma necessidade em que resultaram algumas vitórias políticas"... ora essa... se faz favor.
Então, a defesa do ultra-mar português que fazia todo o sentido não devia ser posto em causa por um certo tipo de ressabiados...
A intervenção do CEP foi atitude mercenária do republicano e custou vidas.
O meu avô esteve lá, sobreviveu e chegou-me a contar muito do que foi o "berço" desta república.

Anónimo disse...

A mim só me apetece dizer hoje !

ALELUIA ALELUIA ALELUIA

Anónimo disse...

De facto, gostei de ler o comentário do sr. Nuno, mas mais uma vez, parece-me que não há um conhecimento sério da realidade de então. Afirmo que a diplomacia republicana teve que defender com garras a sua independência face à Monarquia Espanhola receosa que os ventos da nova República portuguesa chegassem a Espanha. O jogo diplomático português passava pela manutenção da soberania nacional e pelo destaque internacional em relação a Espanha,que de facto foi conseguido após a participação no conflito. O verdadeiro palco do conflito era na Flandres, não em África. Os diplomatas portugueses pensaram que seria mais visivel a acção portuguesa no centro do conflito do que na periferia. A verdadeira guerra jogava-se na Europa, não em África. Apesar de tudo, a diplomacia portuguesa conseguiu algumas vitórias e esse conjunto de "ressabiados" conseguiu manter a independência nacional. Caro Nuno, a sua leitura sobre a correspondência diplomática de Teixeira Gomes está deturpada e parece-me inválida. Terei todo o gosto em ceder-lhe um trabalho académico sério sobre a carreira diplomática de Teixeira Gomes.

Cumprimentos,

JT

Nuno Castelo-Branco disse...

Caro JT, o meu próprio pai é sem dúvida um especialista do Teixeira Gomes e obtenho facilmente a informação necessária. Aliás, num dos últimos trabalhos que realizei na FLL tentei compreender o percurso político das principais figuras da república e sem espanto verifiquei que não valiam grande coisa: para isso, bastava ler os péssimos discursos - de um baixo nível indescritível - no Parlamento da monarquia.. A T.G., reconheço-lhe a categoria de intelectual bon vivant, amante das coisas belas da vida, literato e cortesão por excelência. No que se refere à idoneidade política e diplomático, isso é um outro assunto. O homem enredava-se demasiadamente em intrigas e ódios absurdos, precisamente num país onde o rei de Portugal era muito bem visto e prestava valiosos serviços à causa nacional. O próprio Teixeira Gomes, quando chegou a presidente, iria ser constantemente afrontado pelos seus companheiros de regime e as actas do então Congresso da república contém alguns discursos e ditos tão vergonhosos que me parece bem não serem susceptíveis de publicação. Quando partiu para o auto-exílio em Bougie, talvez tenha pensado no Marquês da Bacalhoa, com o qual exultara poucos anos antes. É que a honradez, caro JT, não é uma coisa de conveniência do momento e já deve ter reparado que nestas "tribunas monárquicas da blogosfera", o ataque pessoal aos homens do actual regime, partem SEMPRE de gente que se reclama republicana, desta 3ª ou da hipotética conceptura 4ª. De nós jamais lerá qualquer tipo de baixeza como aquela a que certa literatura de cordel de há cem anos - e de agora - recorre. Uma vergonha para quem profere tais coisas. Existirão certamente pessoas mais ou menos exaltadas e impacientes com o estado de coisas, mas existem limites que não devem ser ultrapassados, até porque os actuais republicanos - de circunstância, reconheça-se -, tudo estão a fazer para que um novo 1908 aconteça. É contra isso mesmo que nos batemos, Portugal não pode chegar a esse ponto.

Quanto à actividade diplomática na Inglaterra. Como sabe, D. Manuel sempre alertou Lisboa acerca das manobras de Afonso XIII e Guilherme II (neste caso, quanto às colónias, em 1912-23). Quanto à diplomacia, a situação era outra. Um país não pode prescindir da totalidade do Corpo Diplomático que obedece a certos critérios, desde a rede de contactos - e tudo o que isso implica - até a uma certa visão de conjunto daquilo que deve ser a política externa do Estado.A república começou muito mal, como sabe.
Bem fez o novo regime de 1974 em não ter despedido os embaixadores de serviço. Infelizmente, a república criou de imediato anticorpos em todas as capitais europeias, especialmente em França, pasme-se (ou não).
O problema não consistiu na participação na I GM, mas sim o modo como Portugal entrou no conflito, contra todas as probabilidades de sucesso mínimo:
1. Forças Armadas privadas do melhor que o oficialato tinha e que não queria servir um regime já muito desprestigiado e de má reputação em todo o mundo.
2. Sensação generalizada de que a entrada na guerra tinha sido deliberadamente provocada para salvar precisamente esse regime, que até aí pouco ou nada fizera para intervir directamente no Cunene e no Rovuma. Durante quatro anos os alemães fizeram o que entenderam nas nossas fronteiras e os passeios militares - à custa da nossa logística tão mal defendida - de Lettow-Vorbeck ( o Rommel do kaiser) em Moçambique, causaram uma terrível reputação de inépcia ao exército português da república. Recorde-se que poucos anos antes, a Europa admirara-se com as vitórias obtidas precisamente em Moçambique, contra todas as expectativas de ingleses, alemães, sul-africanos, franceses, belgas, norte-americanos, etc. O próprio imperador Guilherme condecorou Mouzinho de Albuquerque com a Águia Vermelha da Prússia.
3. Quando fala dos perigos decorrentes das ambições da monarquia espanhola, tem razão, mas há que recordar que até 1910, esse dito perigo estava completamente afastado pela estreita relação anglo-portuguesa, irremediavelmente comprometida pelo regicídio e pior ainda, pela chegada ao poder de um prp, até aí inimigo visceral dos ingleses. Lembre-se de que toda a guerra feita contra a legalidade constitucional, era em nome da "independência nacional" contra os"traidores Braganças, subordinados aos ingleses". A ameaça espanhola advém da república e a própria Inglaterra podia ter sido tentada ao restabelecimento da ordem em Lisboa, desde que a Espanha se passasse para a Entente. E para mais, talvez obtivesse o Moçambique a sul do Zambeze, Goa, Timor, Luanda, S. Tomé e Cabo Verde. Era tentador, não lhe parece? Veja bem o relacionamento especial que existia entre Afonso XIII - nada germanófilo - com a casa real inglesa, pela primeira vez em séculos de afastamento entre Londres e Madrid. A própria rainha de Espanha era inglesa, como também se previa que viesse a ser a de Portugal, no caso do 5 de Outubro jamais ter vingado. A história é o que é e nada podemos fazer contra isso.
4. Curioso apego republicanos a colónias, depois de ter passado vinte anos a insultar os governos que enviavam as chamadas missões de pacificação a Angola, Moçambique, Goa e Timor.

Anónimo disse...

Caro Nuno,


Faz muito bem a referência às campanhas de pacificação em Moçambique levadas a cabo por Mouzinho de Albuquerque (vivo na terra dele, Batalha) entre outros exploradores/conquistadores (como queira-lhes chamar). Penso que é aí que reside o embrião da conjuntura em que se insere a política externa portuguesa até 1974. De facto, a defesa das nossas colónias foi uma preocupação de todos os governos até à referida data. Serve isto para dizer que, e mais uma vez afirmo, a República fez uma gestão interessante desse jogo de interesses no cenário internacional. Agora vou lançar uma nova premissa. Os comentários aqui lançados lançam ferozes criticas à diplomacia republicana. De certo, deverão conhecer o "desleixo" a que foram condenadas algumas colónias durante o final da Monarquia Constitucional. Perante esta falta de presença portuguesa, as nossas colónias eram partilhadas entre as potências europeias (nomeadamente a "amiga" Inglaterra") num famoso e "secreto" acordo de 1898, no qual estabelecia-se a partilha das colónias portuguesas. Outro exemplo, do desprezo a que a monarquia deitou sobre as colónias. O nosso rei D. Carlos teve a excelente ideia para dar alguma produtividade a aquele bocado de ilha chamado de Timor, de a vender em hasta pública. Mas, infelizmente para o nosso rei não houve compradores. Não serão estes exemplos sintomáticos da ausência de uma política externa forte e com uma visão de futuro? Caro Nuno, a República fez um esforço ténue de desenvolvimento colonial que seria propagado pelo Estado Novo durante os anos 40. Esperarei por opiniões.

Cumprimentos,

JT

Nuno Castelo-Branco disse...

Caro JT

Como sabe, o papel do monarca constitucional era limitado pela Carta, o que torna impossível qualquer decisão no sentido da alienação das colónias. Pelo contrário, o que assistimos foi a um forte empenho do rei junto das forças armadas, precisamente durante o período de ocupação no Ultramar. Os territórios atribuídos a Portugal, eram muito mais vastos do que o país poderia pretender, dada a exiguidade de recursos, desinteresse da iniciativa privada, oposição dos próprios republicanos à primeira guerra colonial, etc. Quando Luís Filipe foi em visita oficial às colónias, o que o prp disse! Se obtivemos aquilo que são hoje os PALOP, isso deveu-se ao interesse da Inglaterra em deixar a um país da sua esfera de influência - Estado tampão amistoso -, territórios valiosos e estrategicamente situados, como mais tarde se provou.
O interesse do rei pela modernização do exército, é indesmentível e para isso, basta consultar as fontes que se referem abundantemente à chegada de material novo, com o qual se fez a primeira guerra mundial.
Ninguém nega a existência de patriotas entre os republicanos, até porque era o espírito da época, ao contrário daquilo que hoje vivemos. O que se critica é a inconsciência no criar de uma calamitosa situação de generalizada insegurança que liquidou o país como agente activo. O nosso século XX fala por si. A república consistiu numa inutilidade e podemos pensar no que teria acontecido se em 1914 a Grande Guerra não tivesse eclodido. Os territórios portugueses eram considerados pela Inglaterra como "reserva" negociável (assim são as grandes potências ao longo de toda a História) e creio que com a situação que se vivia em Portugal, nem um novo Ultimatum seria necessário. Tudo estava previsto. Aliás, é conhecida aquela frase dita por um jornalista inglês, exactamente durante o funeral de D. Carlos: "Ali naquele caixão, vão as colónias de Portugal".
Quanto à venda de Timor: era generalizada a opinião de que as colónias - ou parte delas - eram um recurso vendável, dada a incapacidade do país poder fazer uma gestão à imagem daquilo que os ingleses ou franceses estavam a realizar. O próprio Eça pretendia a venda de uma parte do império, coisa que não era invulgar na época. A Espanha fez exactamente o mesmo com as ilhas Carolinas (se não me engano) e era normal a cedência de territórios em troca de compensações económicas. Felizmente tal não aconteceu e o património colonial deixado pela monarquia chegou praticamente intacto até aos nossos dias, se excluirmos a desastrada gestão dos casos de Goa, Damão, Diu, Ajudá e de... Macau! Mesmo na questão timorense o Estado português foi extremamente frouxo, quando existia mais uma questão a colocar no referendo e à qual Portugal era obrigado a impôr-se. pelo menos de forma platónica. Não o fez. Era o tempo dos sampaísmos.
No que se refere à gestão interessante da diplomacia republicana, na verdade não mudou absolutamente nada na conduta herdada da monarquia e encontrou-se pelo contrário, em maiores dificuldades, devido precisamente ao carácter odioso do regime, pelo menos aos olhos da imprensa estrangeira. basta lê-la e sentirmos um certo embaraço ou pelo menos, orgulho ferido. Foi uma vergonha, não podemos esconder o facto.
Os pequenos países são isso mesmo e a política externa obedece sempre a princípios de gestão da salvaguarda de interesses. assim aconteceu durante a vitória sobre Napoleão; assim aconteceu no período do Congresso de Berlim, manobrando-se habilidosamente junto de Bismarck e do marechal mac-Mahon (que aliás nos apoiaram); assim aconteceu no período do Ultimatum, do qual saímos mais prejudicados, devido exactamente à gritaria republicana nas ruas, que impediram a assinatura do primeiro acordo que previa a outorga da navegação em todo o Zambeze, ligando Angola a Moçambique (!); durante os anos 20, ana SDN falava-se abertamente da outorga de mandatos estrangeiros sobre as nossas colónias, tal era o descalabro escandaloso do regime republicano, com más contas, violência e desleixo absoluto em África, na defesa, etc; assim aconteceu durante os anos 30, quando corriam rumores sobre uma nova partilha de África onde a Alemanha receberia uma compensação com territórios nossos. Nesse aspecto, Salazar manobrou bem e a guerra salvou-nos de um grave perigo. A partir daí, foi o que se sabe: um colossal desastre, do qual africanos, europeus e asiáticos saíram todos prejudicados, embora tenhamos conseguido erguer os caboucos da CPLP.

Quanto a Mouzinho: sendo eu moçambicano de 5ª geração e tendo na estátua de Mouzinho de Albuqquerque - outrora diante da magnífica Câmara Municipal de Lourenço Marques - sido apeada e guardada na Fortaleza da cidade, julgo que a Batalha bem podia estabelecer um protocolo com o governo moçambicano, no sentido de selar a reconciliação, com a entrega da estátua à vossa vila. Ficaria perto da de Nuno Álvares, ou então, junto ao Tejo, na zona de entre a Ponte e Belém, exactamente no local que viu partir e chegar as expedições que comandou. Já não há Mouzinhos. Apenas "soldados milhões", uma outra ficção.