quarta-feira, 29 de junho de 2016

Nem sempre podemos


Seis meses depois, o recuo da extrema-esquerda nas eleições em Espanha é um ténue sinal de esperança nesta Europa crispada e sem norte, em evidentes dificuldades com o ajustamento a uma ordem económica cada vez mais global, que assim se torna pasto das franjas mais demagógicas e populistas.
O facto é que nem sempre “podemos”, e a coligação de radicais liderada pelo lunático Pablo Iglésias perde no seu conjunto mais de um milhão de votos e as forças moderadas exibem uma resiliência notável. Para lá das previsíveis dificuldades do fortalecido Rajoy formar um governo estável, isso é uma boa notícia. 
É sabido como os tempos de crise sempre constituíram uma oportunidade para os extremistas e uma tentação para os alienados. Em Portugal não deveríamos esquecer o sangue, suor e lágrimas que nos custaram os “amanhãs que cantam” emergentes da crise do Mapa Cor-de-Rosa no final do século XIX, cujo delírio deu origem aos mais tresloucados aproveitamentos políticos (como a intenção de se partir para a guerra contra os ingleses com armamento comprado por subscrições públicas).
Desses tempos despontaram impantes os fanáticos “nacionalistas” republicanos, uma virulenta força radical minoritária que dominaria a partir daí a agenda política. Responsáveis pelo assassinato do Chefe de Estado e depois pela messiânica revolução do 5 de Outubro, em 1910 a república interrompeu mais de meio século de aprendizagem da democracia liberal e arrastou o País por dezasseis anos de miséria, terror e despotismo. Foi a oportunidade dada de bandeja a Oliveira Salazar que, em 1928, acabou com o regabofe. 
Acontece que aqui ao lado, no desastrado xadrez da política joga-se muito mais do que uma economia fragilizada, ou a reversão desta ou daquela política. Em Espanha está em jogo a unidade de uma grande potência europeia, que poderá desmoronar pela força dos egoísmos nacionalistas com consequências económicas e políticas inimagináveis. 
Uma vez mais, vivemos tempos perigosos.

Publicado originalmente no Diário Económico

2 comentários:

Anónimo disse...

Texto que poderia hoje muito bem ser divulgado como perfeitamente actual. Premonição?

LB disse...

A malta do Bloco de Esquerda (que consegue ser pior que os do PCP) é como os republicanos de 1910 do tipo "somos muito bonzinhos, somos muito queridos, somos do povo, queremos o bem... mas depois são do mais extremistas e radicais que pode haver. Que nunca governem em Portugal.
E esses do Podemos são iguais.