domingo, 31 de janeiro de 2010

100 anos da república

O Partido Republicano em Portugal nunca apresentou um programa, nem verdadeiramente tem um programa. Mais ainda, nem o pode ter: porque todas as reformas que, como Partido Republicano, lhe cumpriria reclamar já foram realizadas pelo liberalismo monárquico. (…) A república não pode deixar de inquietar o espírito de todos os patriotas.


Eça de Queirós, «Novos Factores da Política Portuguesa»,
Revista de Portugal, Volume II, Abril de 1890,

Não deveriam significar qualquer surpresa as efabuladas evocações que se difundiram e publicaram nos últimos dias a propósito dos festejos do Centenário da República que este fim-de-semana com pompa arrancaram no Porto. Estas constituíram um generoso tempo de antena atribuído ao ancilosado regime pela Comunicação Social que afinal dele julga que depende e presta vassalagem. O que se lamenta profundamente é que a Comissão das Comemorações de Santos Silva e Fernanda Rollo, em conluio com a generalidade desses OCS, em desrespeito pela pluralidade de pontos de vista e liberdade de expressão da qual se consideram exclusivos senhorios, promovam um discurso mentiroso ou idealizado sobre os republicanos da revolução do 5 de Outubro e a história dos últimos cem anos. Isto é fazer pouco da inteligência dos portugueses que conseguem desmontar a mascarada: branquear desta forma impune um dos períodos mais negros da nossa história, que emerge na sequência dum tenebroso duplo assassinato (o regicídio), em que um conjunto de terroristas e radicais se apoderaram durante dezasseis anos dos destinos de Portugal. Nem Fernando Rosas, apesar da sua militância política, tem lata para disfarçar assim as mais salientes nódoas do regime nascido em 1910.

Nas múltiplas entrevistas recentemente concedidas pelas televisões e rádios a um qualquer porta-voz da comissão das festas, quando o pivot, por ignorância, inércia ou cumplicidade, prescinde do sua função critica ou de contraditório, tal constitui indubitavelmente um atentado aos mais basilares princípios democráticos. Quererem impingir-nos sem mais nem menos, que Portugal por causa da sua República é mais livre e desenvolvido do que países como a Bélgica, a Inglaterra, a Holanda ou a Suécia, é uma tremenda embustice que carece ser denunciada. Ignorar que a União Soviética, a China, a Alemanha nazi ou Cuba, foram ou são tão republicanas quanto os governos de Afonso Costa ou Salazar à sua época, no mínimo deveria ser motivo de escândalo. Proclamar que foi a revolução do Partido Republicano Português que trouxe a igualdade dos cidadãos perante a lei, o voto universal, ou a liberdade de imprensa, além de constituir uma prova de colossal ignorância, significa o desprezo pela profunda revolução liberal ocorrida durante o século XIX em Portugal, e um vilipendio a todos os seus protagonistas das mais diversas facções políticas; de então Almeida Garrett, Sá da Bandeira, José Estêvão, Fontes Pereira de Melo ou Ramalho Ortigão. E isso, nenhum jornalista de boa fé deveria jamais ignorar.

É deste modo em nome da liberdade e do direito ao contraditório, que se apela a uma urgente mudança de perspectiva e atitude por parte dos OCS, chamando os críticos da Iª república, monárquicos ou republicanos, ao palanque das celebrações. Porque desprezar a História e comprometer um livre debate sobre a república em nome da propaganda, compromete em primeiro lugar a nação que todos somos. Todos.

Comemorações da república (2)

Não vou aos touros, não gosto (genericamente) de fado e nunca experimentei o mais vago sentimento monárquico. Mas comemorar a Iª República é igual a comemorar o dia em que o nosso tio-avô contraiu sífilis. A abolição da monarquia constitucional resultou da acção de um pequeno bando de rústicos, de carácter, conduta e aspecto duvidosos. O regime imposto pelo bando foi um exercício de limitação sucessiva de direitos concedidos, é verdade que moderadamente, até 1910. Fora a famosa liberdade religiosa, um pretexto para perseguir o clero, no resto, contas por alto, condicionou-se a liberdade de expressão, mediante censura activa, e a liberdade de voto, entretanto restrita aos alfabetizados - cujo número, durante a vigência "progressista" de Afonso Costa e comparsas, misteriosamente quase não sofreu alterações (durante Salazar, curiosamente, sim).
As consequências imediatas de semelhante delírio traduziram-se na emergência do Estado Novo, que adaptou a trela nos costumes e contrapôs ao caos governativo e económico um modelo de ordem, para alívio inicial das massas. As consequências a longo prazo ainda se sentem hoje, quando um país teoricamente civilizado festeja com pompa oficial a delinquência e o atraso de vida, afinal os autênticos "valores" da I República, de que a III, para nosso embaraço, pelos vistos não abdica.

Alberto Gonçalves aqui

Comemorações da república (1)

(...) «A violência da perseguição à Igreja é uma das críticas mais consensuais ao primeiro período da República, mas não é a única. O PRP recorria oficiosamente a milícias populares para "meter na ordem" os descontentes, destruir jornais da oposição e garantir outras tarefas de protecção do regime. E a repressão das greves operárias deu a Afonso Costa a alcunha de "racha-sindicalistas". Ao contrário do sufrágio universal masculino que a propaganda republicana prometera, a capacidade eleitoral continuou a ser vedada aos analfabetos, que eram a maioria da população. O voto das mulheres, esse, estivera sempre fora de questão.

Para o historiador Rui Ramos, os primeiros anos da República correspondem ao domínio exclusivo do PRP de Afonso Costa, que, diz, "representava a extrema-esquerda jacobina da época". Lembrando que Portugal era, "nos anos 20 do século passado, um dos poucos regimes europeus sem sufrágio universal", e que "só em 1915 foram convocadas as primeiras eleições gerais", defende que a monarquia constitucional "esteve sempre à frente da I República face aos padrões políticos, e até sociais, da Europa do tempo". E conclui: "Em termos de democratização, não foi um avanço, foi um dos mais graves retrocessos desde meados do século XIX."

Ramos contesta, aliás, a própria expressão "I República", argumentando que as suas sucessivas fases - os anos de Afonso Costa, com a sua "propensão para a violência e o confronto", a breve ditadura de Sidónio Pais e o período final, marcado pelos governos de António Maria da Silva e pela tentativa de reconciliação com a Igreja - não correspondem a um mesmo regime. E também lhe inspira reservas o próprio numeral, já que, defende, a monarquia constitucional fora já "uma república com rei".» (...)

Cronologia da república - 31 de Janeiro

  • 1912

O exército e a carbonária vandalizam a União dos Sindicatos

Episódios de violência na Moita

  • 1913

É fechado o jornal "O Intrasigente" de Portalegre

Fontes: aqui

sábado, 30 de janeiro de 2010

É fartar, vilanagem!




Amanhã lá estarão todos, para mais um regabofe que o site oficial do regime - a tal vigarice do template grátis a 100.000 Euros - única e exclusivamente propagandeia. Champanhadas, bolinhos, banquetes, charutões, é o que as fotos têm mostrado e nem um texto que se leia, um projecto de regeneração da vida pública ou um simples bocejo de enfado pela desastrosa situação actual. Dali não vem coisa alguma que preste. Nada.

Ratoneiros globais de um Estado exangue. Aldrabões compulsivos que das instituições se servem como esconderijo para todo o tipo de roubos, vigarices e ilegalidades. Uma chusma de térmitas como há muito não se via, sujará amanhã as ruas da cidade azul e branca.

Entretanto, a mitragem escolheu o 1 de Fevereiro, Dia do Regicídio, para a cerimónia do lançamento da primeira pedra do Museu dos Coches. Provocação atrás de provocação e ainda têm a coragem de publicamente afirmar que ..."os republicanos nada tiveram que ver com o Regicídio"... Gabam-se e assumem-no abertamente!

Divirtam-se à conta do Zé Povinho e fartem bem, vilanagem. Enquanto podem.

Cronologia da república - 30 de Janeiro

  • 1912

O governo declara o estado de sítio e entrega Lisboa ao comando militar

Ataques a sindicatos pela G.N.R em Évora

Greve geral com incidentes

Estabelecido o regime de censura à imprensa

Prisão de monárquicos e sindicalistas

  • 1916

Multiplicam-se os assaltos a mercearias pela província

Greve dos trabalhadores rurais na Golegã

  • 1922

Façe aos 35% que os monárquicos conseguem nas legislativas, tendo em conta a existência de irregularidades, Cunha Leal demite-se

A justificação de Cunha Leal era da existência de um conflito diplomático com a Inglaterra por não reconhecer o dia 31 de Janeiro como feriado

Fontes: aqui

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Demissão de ex-Vice-Presidente do Ateneu Comercial do Porto

Por causa disto. E porque a história foi isto.

Ex. mo Senhor Presidente da Direcção
Do Ateneu Comercial do Porto,

Os meus respeitosos cumprimentos.
É com profunda e muito sentida mágoa que me dirijo V.ª Ex.ª para solicitar a minha demissão de associada do Ateneu Comercial do Porto.
Esta minha decisão, devidamente ponderada, deve-se à minha total discordância relativamente ao facto do Ateneu ser o organizador de um evento público (no exterior das suas instalações) no âmbito das Comemorações do Centenário da República, em Portugal.
Trata-se, com efeito, de uma atitude que repudio veementemente por escusada e não muito conforme aos princípios do Ateneu Comercial do Porto.
Sócia há mais de 28 anos, continuando a tradição de muitos antepassados e familiares, não me consigo identificar com uma instituição que toma atitudes como esta. Não me é possível participar nestas comemorações que, para mim, evidenciam mais uma incoerência na sociedade portuguesa - todos os dias nos queixamos do sistema e do regime em que vivemos... mas espantosamente toda a gente se prepara para festejar alegre e insconscientemente o triste centenário de um regime imposto pela força e que até hoje nem sequer foi referendado! Pensava que estas manifestações pertenciam ao passado conturbado do republicanismo em Portugal e nomeadamente ao período da I.ª República.
Infelizmente parece que se querem ressuscitar essas práticas que, se violentas nessas épocas, seriam evitáveis na actualidade. Assim, e não cabendo aqui mais considerações deste teor, o que me resta a fazer e faço é desvincular-me do Ateneu Comercial do Porto.
Acreditava sinceramente que se tratava de uma instituição isenta, pluralista! Aqui se receberam – e bem! – individualidades de todos os quadrantes políticos e ideológicos mas, quando se toma uma atitude pública com estas características não mais se recupera essa imagem!
Como é evidente,não estão em causa as cerimónias calendarizadas para o Salão Nobre em que as palestras anunciadas serão certamente interessantes até porque é indubitável o prestígio dos oradores, mas não posso deixar de colocar duas questões :
1 -Para quê a cerimónia de um clube privado, no exterior das suas instalações?
2 - A quem serve este exercício exibicionista de cidadania republicana?

Quem me conhece poderá calcular o sofrimento que me vai na alma!
Nas instalações do Ateneu Comercial do Porto passei dos melhores momentos da minha Vida. Aqui cultivei saberes ,e sobretudo, grandes amizades. Aqui cresci, frequentando assiduamente os seus magníficos salões e a sua inigualável biblioteca, desde os 14 anos, na minha qualidade de filha de sócio. Durante vários mandatos integrei a Direcção quer como Directora quer como Vice-Presidente (a primeira Senhora a exercer este cargo) orgulhando-me da forma como fui desempenhado sucessivamente estes cargos aos quais me entreguei de alma e coração.
Compreenderão portanto o quanto me é penosa esta tomada de posição mas, os meus princípios assim o determinam.
Mais do quer ser associada desta prestigiada instituição, sou uma pessoa livre e, nesta conformidade, continuo a ser monárquica, advogando para Portugal um futuro melhor do que o presente. Como é do conhecimento de muitos dos associados do Ateneu, acredito que o regime monárquico é preferível ao da república pelo que seria incorrecto da minha parte continuar a pertencer ao Ateneu Comercial do Porto, nestas circunstâncias.
A V.ª Ex. ª e a todos os elementos da Direcção desejo, no entanto, as melhores venturas no exercício das V/ funções a bem dessa instituição que tão querida me é e para quem auguro um futuro que não desmereça o seu riquíssimo passado.
Solicito ainda o favor de apresentar os meus mais cordiais cumprimentos a todos os funcionários que sempre tão correctos foram para mim enquanto sócia e durante o exercício das minhas funções.

A Associada ( n.º 542)
Iza Maria Barbosa Flores Marcos
Porto, 27 de Janeiro de 2010

Cronologia da república - 29 de Janeiro

  • 1912

Eléctricos que furam a greve são bombardeados

  • 1915

É fechado o jornal "A Liberdade" de Aveiro

  • 1916

Protestos em Lisboa contra o aumento dos preços

  • 1918

Os respectivos proprietários encerram 60 fábricas de conserva, em Setúbal, devido a conflitos laborais

  • 1919

Combate em Angeja, entre Monárquicos e repúblicanos

  • 1922

Ameaça de lock-out na Carris

Fontes: aqui

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

"31" de boca

A propaganda da comissão oficial do "centenário" começou de fininho e promete acabar "grossa". Com nada de novo para contar a não ser as desfiadas mentiras e omissões sobre a implantação da república, os cartazes começam a aparecer e a demonstrar o carácter pseudo-historiográfico que envolve a "programação". No primeiro grande evento, um dislate pecaminoso: associar a implantação da república à "Liberdade" – lutar pela liberdade...! com uma sobreposição de imagens de 1910 e Abril de 1974, onde nem falta o cravozinho da praxe! Esclarecedor? Parece coisa de moucos mas é para levar a sério. São as mentiras da república, de fazer um "31"...

Porto 31 de Janeiro de 1891



...ou o ensaio de uma constante portuguesa. Pelo nosso Nuno Castelo Branco Obrigatório.

Cronologia da república - 28 de Janeiro

  • 1912

É fechado o jornal "O futuro da beira" de Castelo-Branco

Em solidariedade com as greves dos rurais alentejanos, a União dos Sindicatos Operários promove em Lisboa greve geral

Augusto Vasconcelos, em carta dirigida a João Chagas, diz que a greve foi boa para tirar 700 bombas à carbonária

Fontes: aqui

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Breve história da «Piolheira»




Mas como isto aqui é a Piolheira, como chamam a Lisboa (...)

Teófilo Braga, «Gomes Freire», 1908

A história é uma destilação do boato
Thomas Carlyle


D. Carlos foi morto de duas formas, por três «criminosos»: o primeiro foi a comunicação social e, consequentemente, pela opinião pública; o segundo e o terceiro, dois desgraçados que, espicaçados pelo oportunismo dos futuros paladinos da República de Outubro, o cravaram de balas julgando matar um monstro criado pelo primeiro facínora. A comunicação social de 1908, como a de hoje, é capaz de levar homens ao patíbulo, sem passar pelo tribunal. Para tal bastam duas ou três palavras bem colocadas; depois é só esperar por quem prima o gatilho.

Mas muito mais poderosas do que o gesto e as balas das armas dos pobres coitados do Costa e do Buiça, meros instrumentos, foram as palavras que continuam a circular. As mesmas que mataram D. Carlos antes do crime do Terreiro do Paço e as mesmas que conspurcam a memória do monarca. Uma delas foi e é a expressão «piolheira». Circulam muitas histórias, sobre quando e em que circunstâncias D. Carlos terá aplicado esta palavra, supostamente como qualificação do seu país. Mas nenhuma sabe, especificamente, aferir da veracidade de tal afirmação.

Piolheira (de piolho) foi uma expressão muito utilizada ao longo do século XIX. Eça de Queirós, Trindade Coelho e Fialho de Almeida usam-na amiúde, quer pela própria mão, quer pela boca das suas personagens para descrever alguns aspectos ora de Lisboa ora de Portugal. Já no longínquo ano de 1858 o poeta Faustino Xavier de Morais (em «Novas Poesias«) se referiu a Portugal como «esta piolheira» e Fialho de Almeida, nos seus Gatos, é particularmente expressivo quando descreve a forma como muitos portugueses deslumbrados pela Europa, se referiam próprio país (1):

Os governos mesmo teem lisongeado esta paixão dos naturaes pelo parisienismo de torna viagem, subsidiando viagens de funccionarios e vadios publicos, de pintores problematicos, e de jovens capacidades scientificas, détournées. Essas viagens d’instrucção, de que jamais se vêem pomos úteis, gastam ordinariamente em pandegas as bourses de travail que geralmente se recusam aos verdadeiros estudiosos, e dão em resultado enviar-se um ingenuo, e receber-se um monsiú de vidro no olho, com barbicha de bode, chupado e tanso, para quem Portugal nunca mais deixa de ser uma piolheira. — Paris, ha Paris! — Quando eu estive em Paris...— Uma noite, em Paris.-.— Mas meu caro, é que verdadeiramente, Paris...E a cada instante este true ritornella-lhes na bocca, para sublinhar a inferioridade manifesta de tudo quanto traz chancella nacional.

Ora, tivesse D. Carlos empregue a expressão para referir-se a Portugal, não seria o único, nem sequer original, a qualificar um país naqueles termos em que a Geração Coimbrã e uma vasta plêiade de escritores e pensadores de oitocentos o fazia, recusando-se a aceitar um país sem a força anímica da França.

Mas, terá efectivamente D. Carlos proferido aquelas palavras? E mais, tê-lo-á feito em público - ele que, como monarca culto e esclarecido, sabia o poder de uma palavra mal interpretada, ou de uma expressão distorcida?

Basta uma pequena pesquisa na internet para perceber o poder e a força da expressão. Ninguém sabe nem quando (uns falam no regresso de Paris) nem como (segundo uns em privados, segundo outros numa entrevista!) D. Carlos teria deixado escapar a referência insultuosa a Portugal. Verifiquei, uma por uma, as 663 referências fornecidas pelo motor de busca Google e em nenhuma delas, absolutamente nenhuma, o respectivo autor da acusação é capaz de citar, com o rigor exigido, onde colheu tal informação. Apenas um jornalista, Luís Miguel Queirós, no Público de 01-02-2008 refere: « Era o monarca [D. Carlos] que achava Portugal uma “piolheira”. Não há evidência segura de que tenha, de facto, proferido esse desabafo, mas quando o boato foi posto a correr, acreditou-se facilmente que era verdadeiro.»

Ora o boato foi lançado antes de 1903, por Bordalo Pinheiro. Passou-o a limpo, em forma de letra, Raúl Brandão, nas suas Memórias (Relógio d’Agua, 1998, p. 46): «Conta que [Bordalo Pinheiro] em Paris ouviu ao rei dizer – Isto aqui é uma terra, lá é uma piolheira.» - é o testemunho de um republicano, mas é, sobretudo, a frase de um dos principais responsáveis pela propaganda anti-monárquica que marcou o final do século XIX e preparou a chegada do golpe de 5 de Outubro. Rafael Bordalo Pinheiro devia compartir o ódio ao rei, com o desprezo ao Estado que lhe recusara uma bolsa de estudo para Roma, em 1868. De resto era um artista, como aqueles que Fialho de Almeida descreve, sempre afeitos às tais viagens de instrução e «bourses de travail». «Piolheira» faria, assim, parte do seu vocabulário quando se tratava de resumir o Portugal que conhecia. As suas caricaturas grotescas e picarescas que roçam a insulto gratuito e boçal são a versão gráfica do que ele teria ouvido dizer da boca do rei. Ele, para quem os reis eram a causa dos problemas do país.

É bem de ver que a história da piolheira se trata de um boato (2). Um boato de entre os muitos que se puseram a circular, e que advinham da proverbial inveja e do sempre actual oportunismo político. Poucos monarcas, como D. Carlos e D. Amélia sofreram tanto com o embate da opinião pública, acicatada por campanhas virulentíssimas de difamação. O escândalo era a melhor forma de propaganda republicana. Como uma franja elevada da população não sabia ler, a caricatura tomava o lugar da palavra, sem qualquer pejo ou respeito, como bem testemunham as ilustrações de Bordalo no António Maria ou na Paródia.

Obviamente que D. Carlos nunca proferiria publicamente um termo tão depreciativo como este. Mas se o tivesse feito, em privado, ou até nos seus pensamentos – algo que nunca saberemos – teria compartido com os homens da sua geração, mesmo aqueles que levantaram o dedo acusatório contra ele, do mesmo sentimento de impotência e desânimo que levou, com tanta facilidade, um pequeno grupo de indivíduos a tomar o poder a 5 de Outubro de 1910.

NOTAS
(1) – De resto a expressão veio a ser retomada, com alguma frequência, pelo neo-realismo literário, pela mão de Alves Redol, por exemplo, que a utilizava para descrever as condições precárias que a revolução burguesa da República de 1910 legara ao proletariado nacional…
(2) Miguel de Unamuno, no «Epitáfio» que «dedica» ao Rei, em 1908, escreve que D. Carlos: «Costumava dizer ao falar da pátria em que reinava: “isto aqui é uma piolheira”» (- Por terras de Portugal e de Espanha, 1989, p. 21). Ora esta afirmação deita por terra qualquer certeza em relação a quando e em que circunstância o monarca teria proferido o insulto. Fora afinal em Paris, aos ouvidos de Rafael Bordalo Pinheiro, ou frequentemente e para todos, como assevera Unamuno…?

Cônsul do Sião em Lisboa, testemunha ocular do regicídio

O regicídio, eventualmente o mais importante acontecimento da história portuguesa contemporânea pelos efeitos imediatos que produziu e pelas ondas de choque que ainda hoje se repercutem, teve um grande impacto na corte siamesa, que foi colhida de espanto e requereu de imediato aos seus embaixadores e cônsules na Europa detalhada informação sobre a tragédia. Da consulta da abundante correspondência diplomática a que tenho acedido, o processo respeitante ao assassinato do Rei D. Carlos e do Príncipe Luís Filipe parece corroborar as conhecidas versões, mas também abrir novas pistas para a compreensão dos factos ocorridos no fim de tarde daquele dia ameno de inverno de 1 de Fevereiro de 1908.


Trinta e seis horas após o crime, o Príncipe Devawongse Varoprakan, irmão do rei Chulalongkorn do Sião e Ministro dos Estrangeiros siamês, foi informado em Banguecoque da gravidade da situação portuguesa. O telegrama vinha de Paris e fora enviado pelo embaixador siamês em Paris, Príncipe Charon. Informava laconicamente que o Rei de Portugal fora alvo de atentado e que não sobrevivera. Sugeria o Príncipe Charon que o Rei Chulalongkorn fosse informado com a máxima urgência e que fosse enviado telegrama de condolências à Rainha Dª. Amélia, à Rainha Mãe [Maria Pia] e ao novo Rei D. Manuel. Na manhã seguinte, o Cônsul Geral de Portugal em Banguecoque informava o MNE siamês da ascensão ao trono do Infante D. Manuel, pedindo às autoridades siamesas que proclamassem luto em memória do Rei falecido. O titular dos Estrangeiros siamês respondeu ainda nessa tarde ao representante português junto da corte, informando-o que o Rei Chulalongkorn fora acometido de grande pesar pelas terríveis novas.
No dia 14 de Fevereiro, num longo e detalhado relatório, o Príncipe Charon dava conta ao monarca siamês dos acontecimentos. O então cônsul siamês em Lisboa, Pinto Basto, era amigo pessoal do Rei D. Carlos e fora testemunha presencial do atentado, pelo que a informação transmitida por Charon provinha de fonte absolutamente fidedigna e com acesso a altas instâncias do Estado e da corte portugueses. O Príncipe Charon, ao saber do regicidio, apanhara de imediato o Sud-Express e chegara a Lisboa ainda se faziam preparativos para as solenes exéquias. Pinto Basto lavrou o seu testemunho. Desse, avultam os seguintes elementos, que estimamos importantes:

1. Pinto Basto encontrava-se a cerca de 35 metros do landau que transportava a família real.
2. Ao iniciar-se o tiroteio, Pinto Basto correu em direcção ao centro do tiroteio e verificou que a polícia atirava em todas as direcções, tendo escapado por pouco ao fogo dos agentes, que pareciam desnorteados e incapazes de seleccionar alvos.
3. Pinto Basto participou na caçada aos regicidas e agarrou um deles, entregando-o à polícia que inexplicavelmente o abateu no próprio local.
4. Pinto Basto entrou no Arsenal e ajudou a retirar os corpos do Rei e do Príncipe Real. Verificou que o Rei se encontrava morto, pois recebera fatal disparo na medula. O Príncipe Luís Filipe agonizava e não resistiu por muitos minutos aos ferimentos recebidos.
Quanto às causas do regicídio, Pinto Basto esclarecia:
1. O Atentado não fora obra de anarquistas, mas decorrera de um vasto complot de revolucionários profissionais, bem organizados, muito bem adestrados e dotados de armamento de grande precisão.
2. A finalidade do atentado era a de matar por atacado toda a família real, bem como o Presidente do Governo.
3. Depois de desenvolver os seus pontos de vista muito críticos a respeito de João Franco, Pinto Basto não deixava de tecer elogios às reformas que o chefe do governo desenvolvia, bem como destacar as qualidades de serviço e honestidade que sempre evidenciara.
4. Os assassinos eram portugueses e alguns destes parece terem sido contratados para executar o crime. O número de criminosos envolvidos seria muito superior ao dos terroristas abatidos pela polícia. Pinto Basto afirma que ao longo de todo o trajecto havia atiradores de atalaia - todos envergando capas ou longas samarras - e que ninguém parece ter-lhes prestado atenção.
Chulalongkorn recebeu e leu o longo relatório e informou posteriormente o seu MNE que ficara muito abalado e perplexo com tudo o que lera. O Sião e Portugal iniciavam um longo afastamento que só seria emendado em finais da década de 1930.

O busto republicano




Lá andam eles à volta de paninhos bordados, rendinhas, velinhas, pedacinhos de barro e musiquetas várias. Correspondem exactamente àquilo de que gostam acusar aqueles que hoje quase desaparecidos, eram entre nós chamados de "monárquicos de reposteiro".

O senhor António Reis, além de ter ficado bastante nervoso com o apelo comemorativo do seu colega João Vaz - o tal cavalheiro que quer homenagear os regicidas -, agora enveredou pela contenda que entre eles corre acerca da "modernização" do mamarrachinho da tal Ilda. Nem se percebe o porquê de tal questão, dado o soberano desinteresse que a população portuguesa sempre demonstrou por tal peça decorativa de topo de frigorífico. É que o busto nem sequer serve de entretenimento, à imagem daqueles mastins que tinham uma cabeça basculante, manifestando o sim-sim sempre que alguém abria e fechava a porta do aparelho. Mas enfim, parece que o sr. António Reis, ajudado pelo colega Arnaut, recusam liminarmente a sugestão à século XXI, com uma interessante declaração:

"Os símbolos são representações perpétuas da ideia (...) assim como não se pode alterar a bandeira e o hino"...

Como bons cata-ventos, a brisa sopra de outro lado e já se esqueceram dos milhares de bandeiras nacionais queimadas em autos-da-fé no Rossio e Restauradores, além dos escudos nacionais picados a camartelo nas frontarias dos edifícios públicos (1910). Pelo menos, registamos a lição para futuras possibilidades, mas cremos não chegar a tanto.

Entretanto, os escultores vão dizendo o que pensam e manifestam-se geralmente contra a iniciativa, embora João Cutileiro pense que a tal Ilda não passa de ..."uma cópia do francês e não é apropriado para representar Portugal". Pedro Cabrita Reis considera ser necessário manter-se a dita representação escultórica, "para reforçar a vacuidade dos símbolos".

Nada mais nada menos, senão a vacuidade. Uma grande verdade!

Cabrita Reis deixa ainda uma enigmática sentença, , quando exprime a opinião de que ..."só um motivo de força maior, como a instituição de uma monarquia novamente em Portugal", seria uma justificação para a alteração dos símbolos regimentais.

Quanto a isso, caro Cabrita, não se preocupe. Uma vez que o "motivo de força maior" está à vista de todos, já há quem esteja a tratar do caso.

Cronologia da república - 27 de Janeiro

  • 1912

Duelo entre os deputados Álvaro Pope e Camilio Rodrigues

  • 1918

O general Tamagnini de Abreu, comandante do CEP no teatro de operações, pede a suspensão das suas funções e regressa a Lisboa

  • 1919

Combates em Águeda, entre Monárquicos e repúblicanos

  • 1923

É fechado o jornal "A Voz Republicana" de Viana do Castelo

Fontes: aqui

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Republicanos apelidam os seus crimes de "actos históricos"




Lisboa, 25 Jan (Lusa) - Os promotores da romagem à campa dos homens que mataram o rei Dom Carlos voltam a homenagear os regicidas no próximo domingo, este ano com fortes críticas ao programa do centenário da República por excluírem o regicídio das comemorações.

"Basta ver as comemorações oficiais: da Presidência da República ao primeiro-Ministro, passando pelos municípios a nível nacional, apenas Castro Verde inclui o regicídio nas comemorações alusivas ao centenário da implantação da República", disse à Agência Lusa o presidente da Associação Promotora do Livre Pensamento (APLP), Luís Vaz.

É esta associação que, pelo terceiro ano consecutivo, promove uma romagem às campas de Manuel dos Reis Buíça e Alfredo Luís Costa, os homens que, a 01 de Fevereiro de 1908, mataram o rei Dom Carlos e o príncipe Luís Filipe.

Lisboa, 25 Jan (Lusa) - O grão-mestre do Grande Oriente Lusitano (maçonaria) considera que não existe justificação para incluir o regicídio nas comemorações do Centenário da República, pois este "acto histórico" não foi da autoria do Partido Republicano.

António Reis comentava, desta forma, a crítica do historiador Luís Vaz, presidente da associação que domingo promove uma romagem às campas dos homens que mataram o rei Dom Carlos, em 1908.

Cronologia da república - 26 de Janeiro

  • 1912

Os responsáveis pelas greves rurais, acusados de crimes políticos, são presos no Limoeiro

  • 1914

Uma manifestação nocturna, promovida por Afonso Costa para apoiar os democráticos, acaba em cena de pancadaria no Rossio.

Nessa mesma noite, membros do Formiga Preta, cercam o jornal "O Mundo"

A manifestação oposicionista, organizada na mesma noite por Machado Santos, Júlio Martins, Carlos da Maia e Rocha Martins, vai do largo de Camões para Belém, encontrando a manifestação democrática

Os oposicionistas exigem a demissão de Afonso Costa, amnistia para todos os presos políticos e reabertura das associações sindicais encerradas

  • 1916

Greve dos operários de lanifícios da covilhã

  • 1919

É fechado o jornal "O Madeirense"

É fechado o jornal do Funchal "O Nacional"

Fontes: aqui

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

O "outro" 31 de Janeiro

31 de Janeiro de 1912, fazia 21 anos sobre a 1º revolução republicana. Instaurada a Republica, resolve o regime comemorar tão ilustre data com uma campanha de repressão sobre o proletariado, que apenas exigia os seus direitos...salário de 400 reis (conforme o previsto na tabela de salários minímos, em Evora) e não os 320 reis aprovados pela assembleia de lavradores, que teve o aval do Governador civil António Paulino de Andrade.

No dia 24 de Janeiro é cercada a cidade de Évora e cerca das 12 horas chegou à Praça do Geraldo um esquadrão da guarda nacional a cavalo que faz debandar os trabalhadores para o Rossio de São Brás e depois de os perseguir à espadeirada, no Largo Severim de Faria quando encontram resistência começam aos tiros, um dos quais atinge mortalmente o operário rural Manuel Charneca, de Machede, havendo ainda muitos feridos, alguns deles entre os militares, conforme nos relata o quinzenário da Associação dos Empregados de Comércio Local, "O Despertar".
Por seu lado "O Sindicalista", semanário defensor da classe trabalhadora, publicado em Lisboa, pela boca do seu enviado a Évora, que assistiu aos acontecimentos, e de outros dois participantes nos mesmos, fala da investida conjunta da Cavalaria 5 e da guarda municipal pelo início da tarde no Largo Severim de Faria, onde os grevistas estavam reunidos, distribuindo cutiladas e fazendo fogo sobre os operários causando a morte do trabalhador de Machede e muitos feridos graves, tendo de seguida sido feitas numerosas prisões, mais de trinta entre homens e mulheres, e encerrada a Associação da Construção Civil e Artes Auxiliares que terá ficado com a fachada crivada de balas e parte da ombreira despedaçada.

slogan da republica
desenho de Stuart de Carvalhais -publicado no "A Lanterna"-a ilustrar os acontecimentos de janeiro de 1912


O diário republicano mais importante da época, O Mundo, traz-nos um relato ainda mais acutilante na base de depoimentos de cidadãos eborenses « cavalheiros insuspeitos, completamente alheios à greve, dedicados republicanos que só procuram manter a paz » que, ouvidos pelo delegado do Governo, falam de homens e mulheres deitados no chão e espancados ameaçados por espingardas, de bandeiras republicanas rasgadas e de uma verdadeira carnificina quando a indignação de alguns grevistas perante este tratamento inumano os levou a arremessar algumas pedras contra a força armada que, como se disso estivesse à espera, logo alvejou os trabalhadores brutalmente, um deles mortalmente e crivou de balas a sede da Associação das Classes Mistas, satisfazendo a raiva de alguns lavradores e do governador civil, eles porque não cederam e este porque desprezou as reclamações operárias e conservou as associações encerradas.


A "Conspiração monárquica" em defesa dos trabalhadores

O governador civil triunfante, todavia, não se deu por satisfeito com a carnificina e numa reunião com representantes dos proprietários e dos trabalhadores, imediatamente posterior a estes trágicos acontecimentos, manda prender dois membros da comissão dos trabalhadores, o que parece tratar-se de uma cilada antecipadamente preparada....entretanto em Lisboa elabora-se a tese da "conspiração monárquica"

Mas a feroz repressão atinge não apenas os trabalhadores rurais mas também os opositores republicanos do vitorioso governador. O corticeiro António Moura e o professor de liceu Vasques Mesquita são presos enquanto Evaristo Cutileiro logra escapar a um mandado de captura ("O Sindicalista"). Depressa este aproveitamento para linchar opositores politicos republicanos se faz sentir em Lisboa.

O Governo, convencido que a greve tinha terminado,e numa tentativa de evitar cisões entre republicanos publica uma nota oficiosa com uma versão muito particular dos acontecimentos, onde sobressai a tese da conspiração monárquica.


31 de janeiro de 1912
clicar para ver imagem inteira

Os tumultos chegam à Capital, como já foi referido noutro post, culminando com a entrega da capital ás forças de segurança, recolher obrigatório e o assalto e encerramento da Casa Sindical, na Rua Formosa (em Lisboa)- a casa ao fundo à esquerda, com bandeiras- no dia 31 de janeiro de 1912...


...21 anos depois do 31 de janeiro de 1891, a Republica consegue comemorar uma data essencial na sua história com a junção dos trabalhadores e dos monárquicos num concluio contra a "República" dos lavradores.

é preciso ter talento para tanto

Abandonada como inútil traste


Como hoje entendo aquelas duras palavras, quando deparando com a chegada do 1º ministro Balsemão e do ministro Freitas do Amaral à sede do PPM, se virou para o staff da J.M. exclamando:

-"Meus senhores, chegaram os caixeiros-viajantes. Podemos começar!"

*********************************

Exactamente no ano do Centenário da Republica, o Centro Nacional de Cultura homenageará o monárquico João Camossa, um dos seus fundadores (1945) e presidente (1949), na próxima terça-feira, 26 de Janeiro de 2010, pelas 18.30H.

Centro Nacional de Cultura
Largo do Picadeiro 10 (ao Chiado-S.Carlos).

Cronologia da república - 25 de Janeiro

  • 1911

Protestos contra a república em Cabo-Verde

  • 1912

Greve dos alunos do liceu de Braga

  • 1915

Tentativas de assalto a vários quarteis

  • 1918

Manuel Teixeira Gomes, embaixador em Londres, é exonerado pelo governo

  • 1919

O embaixador americano em Lisboa, propõe aos aliados a criação de um protectorado sobre Portugal e a possível intervenção nos assuntos portugueses

O governo pede a demissão

  • 1920

É fechado o jornal "A Razão" de Aveiro

  • 1921

O parlamento autoriza o governo a contrair empréstimos para fazer face à crise económica

Fontes: aqui

domingo, 24 de janeiro de 2010

"Sensibilidade e bom senso": a monarquia segundo Alexandre Herculano




«Olhamos impassivelmente para as doutrinas republicanas, como olhamos para as monárquicas. Não elevamos nenhuma a altura de dogma. Não nos cega o fanatismo, nem perguntamos qual delas tem mais popularidade. É já tempo de examinar friamente, e de discutir com placidez, qual dos dois princípios pode ser mais fecundo para assegurar a liberdade e, depois da liberdade, a ordem e a civilização material destas sociedades da Europa, moralmente velhas e gastas. Persuadidos de que a monarquia, convenientemente modificada na sua acção, resolverá melhor o problema, preferimo-la sem nos irritarmos contra os seus adversários; sem os injuriarmos, sem acusar as suas intenções, recurso covarde de quem desconfia da solidez das próprias doutrinas. A nossos olhos a monarquia existe pelo povo, e para o povo, e não por Deus e para Deus. A existência de um poder público, de um nexo social, é o que se estriba no céu, porque a sociabilidade é uma lei humanitária. A revelação divina confirmou este facto achado também no mundo pela filosofia política. “Por mim”, disse a voz do Senhor, “reinam os reis, e os legisladores promulgam o que é justo”. A sabedoria suprema supôs a autoridade na terra: não curou de que fosse só um que a exercesse, ou que fossem muitos. Aprendamos a tolerância política nas divinas páginas da Bíblia.»

HERCULANO, Alexandre – Opúsculos. Tomo I. Questões públicas: política. Lisboa: Livraria Bertrand, 1983, pp. 267-268

Cronologia da república - 24 de Janeiro

  • 1912

Confrontos em Évora, entre trabalhadores rurais e a G.N.R, resultando num morto e seis feridos

  • 1914

Protestos em Lisboa contra o governo

Os trabalhos parlamentares são adiados derivado à discórdia reinante

Para tentar por fim ao conflito governamental, Manuel de Arriaga avança com um conjunto de propostas para os principais partidos. Têm a oposição de Afonso Costa

João Chagas pensa que para haver ordem, não pode haver debate de ideias, pela impossibilidade de diálogo

  • 1915

O governo pede a demissão por Manuel de Arriaga recusar um decreto que suspendia as garantias individuais

Fontes: aqui

sábado, 23 de janeiro de 2010

Um poema em homenagem a João Camossa

Eu, monárquico, me confesso!

Um dia, bem distante e tão presente,
perguntei a meu pai porque sorria.
E ele, num ímpeto de carinho e desalento,
me respondeu: - Meu filho, por te conhecer
aceito a verdade da tua escolha.
Mas ao percorrer a vida passo a passo,
sofro pelo futuro que te espera.
Singelas palavras, sábia profecia!
Quisera eu que essa visão não fosse
nada mais do que um fantasma,
tentando ensombrar a claridade deste sonho!

Os dias e os anos foram desgastando,
vertiginosamente, deixando em mim presentes
as palavras sussurradas naquele momento
de discreto e sugerido lamento.
Apenas um instante, um instante apenas,
feito de mastros de navios, em marés acordadas.
Era uma canção escrita com cenas dum grito
de revolta, repulsa e desalento. E eu, em cada crise
em que me envolvo, transfiguro-me e vagueio por
todos os locais feitos de imagens, sozinho e nu.

Eu pecador me confesso! No meu grito de revolta,
alcanço ainda forças para um poema de esperança,
qual regato de águas serenas e cantantes, vibrando
pelo Rei ausente, mas de desejo bem constante.
E, de súbito, todo aquele poema de espadas e penas
se transforma num sonho pueril e distante.
Ser monárquico, é sonhar a inocência singular duma
fidelidade a ideais de cavaleiro andante, a juramentos
impregnados da candura do acreditar na beleza original.
Ser monárquico, é recriar a imagem da saudade paterna,
do aconchegante regaço maternal, da inocência de padrões
de conduta, que mergulham nas raizes mais distantes.

Por isso me confesso pecador! Por acreditar nessa simbiose
de saudade e futuro, de passado e presente, qual grito rebelde
de liberdade, voando por memórias renascidas.
Por isso me confesso pecador! Por ter presente dia a dia,
que o Rei da minha nostalgia desejada, transforma em poema
todas as vagas profundas e enfurecidas dum grito de igualdade,
suportado por recordações de injustiças e mãos vazias.
Por acreditar nesta bandeira azul e branca, símbolo dum dia
claro de sol vibrante e águas límpidas.
E se o sonho for poema acrescentado, rebelde como um grito
de criança, constante como marés acordadas, intenso como
paixão de secretas cores, onde me possa afogar absorvendo
a beleza nesse limiar do infinito, com vigor gritarei ainda:
Real, Real, pelo Rei de Portugal!

Deixai-me ainda acreditar no sonho!
Deixai embora que essa ofuscante claridade,
rasgue as vestes sombrias dos sentidos
e percorra todo o meu ser, até ao limiar do infinito.
Deixai que o símbolo da minha demência, seja a demência dos
símbolos da dignidade renascida, da portugalidade recriada,
do orgulho numa fraternidade de diferenciação entre iguais.
Deixai que eu seja um mero menestrel
duma sociedade de sentido renascido,
cantando a beleza da minha bandeira azul e branca,
gritando esse brado do Álcacer da nossa perdição,
qual Sebastião de Sá, que me honra o sangue, morrendo,
entre iguais sem desistir de lutar: - O meu cavalo não sabe voltar!

Fernando de Sá Monteiro

Ler o preâmbulo aqui

Cronologia da república - 23 de Janeiro

  • 1914

Manuel de Arriaga sugere o afastamento de Afonso Costa

  • 1919

Tentativa de restauração monárquica em Lisboa

O governo tenta pressuadir todos os militares do CEP a defenderem a república

As insubordinações monárquicas em Bragança e em Viseu são reprimidas pelo exército

Fontes: aqui

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Há-de brilhar!

Toponimias da propaganda

Ironia- Na placa lê-se: Rua Afonso Costa --» Igreja


(...) Num dos meus primeiros posts no Beijós XXI, há 2 anos, dizia eu: «A toponímia beijokense está completamente infestada de socialistas positivistas, alguns governantes, outros caceteiros, da 1ª República». Infestação é uma figura de estilo e manifesta uma opinião pessoal, mas pretende representar essa realidade que é o facto de figuras ligadas ao regime (embora apenas um deles lá tenha chegado) da 1ª República terem nomeado as ruas principais.

Como comemoramos com orgulho patriótico-militar, todos os anos, o 5 de Outubro, acabamos por aceitar passivamente a ideologia dominante que diz que a "revolução" de 1910 acabou com uma ditadura e instaurou uma democracia. Acreditar nessa fantasia é o mesmo que acreditar que a revolução de 1917 instituiu a democracia na Rússia - o que se passou foi que alguém, em nome do povo, assumiu o poder para logo de seguida oprimir o dito povo e nem sequer lhe dar direito a voto. Por mais que nos custe admiti-lo, o regime instaurado em 1910 foi menos democrático do que o das últimas décadas da monarquia. Na maior parte das eleições após a implantação da República, só podiam votar os homens letrados, estavam excluídas as mulheres e os analfabetos, i.e. estava excluída a grande maioria da população que vivia fora das cidades e que, na opinião dos positivistas, estava dominada pelos padres e não conseguia perceber o progresso que o novo regime prometia. O regime era, na prática, um regime de partido único e todos os órgãos de poder se confundiam com o partido (mesmo a nível local, como referi aqui).
É este regime que a toponímia beijosense, em larga medida, representa e teremos de decidir se é isso que queremos. Deste modo, creio que seria de alterar os nomes da Rua Afonso Costa Igreja, Rua Miguel Bombarda e Travessa Miguel Bombarda.

Afonso Costa é mais conhecido. Entre os católicos convictos, é famoso pela política de subjugação da Igreja ao Estado, sendo deveras interessante(!) ter uma placa com o seu nome no muro do adro; interessante não deixa de ser também o facto de nos mapas online e aparelhos de GPS a Rua chamar-se Afonso Costa Igreja ::)
Miguel Bombarda não é tão popular, é mais conhecido como psiquiatra. Não viu a revolução porque foi assassinado na véspera por um doente. No entanto, quem estudou o seu papel no movimento republicano não tem dúvidas em associá-lo a uma faceta mais sinistra das ideologias que o suportavam. Miguel Bombarda era profundamente positivista e acreditava que era possível manipular o cérebro para levar os indivíduos a agir de acordo com o ideal de uma sociedade mais justa, de uma sociedade ideal. As suas ideias foram a base da deportação dos jesuítas, considerados anómalos - algo de natureza semelhante à deportação de judeus pelo regime nacional socialista. Tiveram também seguimento na equipa que desenvolveu a controversa lobotomia.

Quanto à Rua Abade Pais Pinto, única no país (acho), poder-se-á manter - não porque alguma vez tenha sido um benemérito de Beijós, mas precisamente porque nem a freguesia de Cabanas, nem a de Silgueiros lhe prestaram qualquer homenagem pelos valores que defendeu, bem diferentes daquilo que o regime com que sonhava viria a por em prática. Ficando a nossa freguesia entre aquelas duas...

Cronologia da república - 22 de Janeiro

  • 1911

Greve na CP

  • 1917

Tentativa de golpe de estado

  • 1919

Revolta monárquica em Lisboa

O governo incentiva a constituição de mais batalhões de voluntários da república

Fontes: aqui

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Poesia de intervenção.



A intervenção contra a I República surgiu de vários quadrantes da sociedade, nomeadamente dos artistas. O Movimento Modernista, de que destacamos Fernando Pessoa e Almada Negreiros, foi bastante crítico em relação ao novo regime. Um dos mais famosos e severos manifestos contra a República surgiu pela mão de Almada Negreiros. Intitulava-se "A Cena do Ódio" e, como o autor refere, foi escrita durante o clima de rebelião que se instalou nas vésperas do 15 de Maio de 1915 (Ditadura de Pimenta de Castro). Nesse longo poema, A.N. expõe o carácter burguês da revolução e dos seus agentes, criticando o laxismo da sociedade de Lisboa, o oportunismo político e a falta de oportunidade das revoluções («aprende a ler corações, que há muito mais que fazer do que fazer revoluções»):

[...]
Eu creio na transmigração das almas
por isto de Eu viver aqui em Portugal.
Mas eu não me lembro o mal que fiz
durante o Meu avatar de burguês.
Oh! Se eu soubesse que o Inferno
não era como os padres mo diziam:
uma fornalha de nunca se morrer...
mas sim um Jardim da Europa
à beira-mar plantado...
Eu teria tido certamente mais juízo,
teria sido até o mártir São Sebastião!
E inda há quem faça propaganda disto:
a pátria onde Camões morreu de fome
e onde todos enchem a barriga de Camões!
[...]

O poema integral pode ser lido aqui, e ouvido aqui, pela boca de Mário Viegas

Ir mais atrás


A ética republicana, o legado da revolução francesa. por Rui Albuquerque de volta ao Portugal Contemporâneo.

Quem consegue digerir a República? - III


"Nem Hercules teria força, já , para nos lavar. Só Hercules foi capaz de lavar os estabulos d'Augias e assim mesmo atirando para um d'elles com um rio n'um assombroso esforço titanico. Mas, positivamente, tres mil bois sujam menos que tres mil latrinas d'almas immortaes a quem o Ideal abriu a torneira e poz em cima de nós a esguichar. E de que raça! Da raça Theofilo, Junqueiro, Affonso Costa, Bombardino e Cabrito Macho!"

Jornal Povo de Aveiro, 22 de Maio 1910

Quem consegue digerir a República? - II

"Em Portugal, todo o movimento revolucionário se caracterisou e caracterisa pelo mesmo impudor, a mesma desenvergonha, a mesma lubricidade porca, o mesmo triumpho dos bordeis... a legislação da republica apressou-se a depor nas mãos dos prostibulos terriveis armas de combate para a sua lucta eterna contra a virtude.

O' corja, O' prostibulo! O' cloaca maxima!"


Homem Christo, Banditismo Político. Madrid. 1913

Cronologia da república - 21 de Janeiro

  • 1911

Homem Cristo, director do jornal "Povo de Aveiro", é exilado em Vigo, após o jornal ter sido encerrado

Por decreto, a capela da Universidade de Coimbra é transformada num museu.

  • 1913

Greve geral de funcionários ligados às actividades marítimas

  • 1914

O senado aprova uma moção de desconfiança ao governo de Afonso Costa

Anuncio de várias greves em solidariedade com os trabalhadores da CP

A greve dos comboios gera uma onda de contestação

  • 1915

O "Movimento das Espadas", protesto pela demissão do Major João Craveiro Lopes, conta com a participação de Machado Santos. Pretendiam entregar as espadas a Manuel de Arriaga. Resulta na prisão dos participantes.

  • 1918

É fechado o jornal "A Resistência" de Castelo-Branco

  • 1919

A monarquia é proclamada em Espinho

  • 1920

É decretado o estado de calamidade no Porto com o encerramento de redes sindicais e a efectuação de várias prisões.

  • 1922

Greve na Carris

  • 1926

É fechado o jornal "A opinião" de Setúbal

Fontes: aqui

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Quem consegue digerir a República?

Não fosse o, conveniente, alheamento do comum cidadão – que vive para a barriga e para o sossego –, a propaganda facciosa – daqueles que tentam, até, sonegar a II república da história recente –, o encobrimento e a lavagem metódica levada a cabo pelos sorvedouros deste regime sempre ávidos a rapar o "tacho", ninguém conseguiria digerir a ética e o ardil "orgânico" desta.

Perfis: Afonso Costa. "A hora é dos medíocres"


Estátua a Afonso Costa no Campo 24 de Agosto, Porto.
Obra de Laureano Guedes.
É tradicionalmente um local de romagem
onde alguns saudosistas vão no dia 31 de Janeiro,
confundindo fascismo com monarquia
e república com liberdade, mas sobretudo
esquecendo o governo de terror
e perseguição que Afonso Costa
imprimiu durante a
I República

Escreve Raúl Brandão, nas suas Memórias:

«Os ódios aumentam. Os republicanos torturam os presos. Mas o que fariam os monárquicos se vencessem? A monarquia, nesta altura, seria de fugir… E a república? A república – diz Junqueiro – não se atura nem se pode aturar!
Foram os do governo provisório que lhe imprimiram o feitio intolerante e jacobino – foram o Afonso Costa, O Bernardino, o Camacho e o António José. Foi principalmente o Afonso que lhe colou a máscara que ela nunca mais pôde arrancar. Fê-la à sua imagem e semelhança: materialista e orgíaca, acolhendo de braços abertos a pior escória dos partidos monárquicos – os que não tinham convicções e queriam continuam no gozo dos seus interesses».
É o tipo do bicho de escritório que julga tudo segundo a papelada e mete a vida dentro de articulados. Advogado cábula, foi para o governo, com os seus amigos, depois de uma orgia à luz da manhã e com a gola do casaco levantada. Ora o país não é apenas sério: é trombudo. Remexeu nas cousas e nos homens resolvendo dar cabo do cristianismo no Palácio de Cristal no porto – daquele Porto de granito espesso – em duas ou três gerações. Resultado: quem reformou os padres foi ele – não foram os arcebispos. Quando acabou de pegar fogo ao país fez de largo a vê-lo arder… Chegou, assim, a ser um símbolo – o tipo das gerações de Coimbra, que criaram, com código e frases, uma alma ao lado da vida. Tudo o que fez cheira ao saguão onde o fez – às conversas do empregado da Boa Hora, do jornalista azedo e do Alexandre Braga, que fez da existência uma orgia – com esplêndidos discursos… (…)
Dizem que é um homem inteligente. A sua inteligência, até hoje não tem passado de esperteza. Só lhe reconheço uma superioridade incontestável: é um parlamentar e não se prende com escrúpulos. – O Afonso – dizem – é um homem com quem todos se pode entender para os seus negócios.
Não é só o medo que o tem afastado de Lisboa. Às repetidas instâncias dos seus amigos para regressar à política recusou sempre, recomendando uma certa moralidade (!) – o que fazia dizer a António José de Almeida: - Eu, se me chamassem para o meu país, voltava logo, ainda que fosse para ser capitão de ladrões!
Mas não é só o medo que o tem afastado. – Porque não vais para Lisboa? – perguntou-lhe o Montalvão, que o encontrou em Paris. – Não, que lá até os rapazes de catorze anos andam com bombas nas algibeiras. – Andam, mas foi ele o culpado – foi ele que as forjou. Não é, porém, só o medo; os que fingem que o querem a governar, detestam-no. Armam-lhe logo dificuldades. Sabem perfeitamente que ele viria ocupar o primeiro lugar… A hora é dos medíocres.»

BRANDÃO, Raúl – Memórias (tomo III). Obras completas, vol. I. Lisboa: Relógio D’Agua, 2000, pp. 62-63

Mário Soares e a 2ª República A e B




Mário Soares teima no pregão "vivemos hoje na 2ª República!".

A insistência do dr. Mário Soares é a falsificação de uma história que a poucos mais incomoda, a não ser ao próprio e ao seu círculo de influência. A 2ª República já existiu em toda a sua formalidade autoritária, tal como ninguém nega a evidência de uma República no Irão, na China, na actual Rússia, em França, na Itália ou nos EUA. Desde 1910 existe a forma que consiste na base para toda a construção de um Estado. A Bandeira é exactamente a mesma que numa hora de efervescência, foi adoptada sem possibilidade de consulta popular. O Hino, a miguelista A Portuguesa, é exactamente o mesmo na música e na letra, que aquele adoptado em 1911 pelo primeiro Parlamento da 1ª República. A induzida devoção à figura do Presidente da República, foi estatuída severamente pelo regime do Estado Novo, pela 2ª República. Ainda hoje são visíveis as consequências, apesar de consecutivas participações desastrosas nos assuntos da política sectária. Todos os departamentos que conformam o funcionamento institucional, jamais deixaram de ostentar um “da República”, frisando a forma.

Dr. Mário Soares, a 2ª República existiu e V. Exa. viveu-a longamente. Decerto recordar-se-á daqueles dias em que era polidamente chamado à António Maria Cardoso, para os circunstanciais interrogatórios. Que Bandeira esteve tantos anos hasteada naquela varanda?

A foto que ilustra este post, refere-se ao funeral do Dr. Salazar. Que bandeira se encontra sobre o caixão?

Centenário da República: ontem e hoje

Ontem chamei-te incompetente. Ontem minei-te o poder dentro do nosso Partido. Ontem mandei-te tirar a minha foto do cartaz. Ontem quebrei o teu valor facial, tornando-te má moeda.

Hoje fiz-te grã-cruz. Para que te cales e não me estragues o projecto.

Cronologia da república - 20 de Janeiro

  • 1913

22 presos políticos são transferidos da Trafaria para Lisboa

  • 1915

Insubordinação em quartéis militares lisboetas

É fechado o jornal "O século" de Lisboa

  • 1920

Greve de operários no Porto

Atentados terroristas

Greve geral promovida pela CGT

Para António Maria da Silva o país têm estado a saque

Rumores de organizações secretas no exército

Os anarco-sindicalistas chamam os republicanos de traidores











Fontes: aqui

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Cronologia da república - 19 de Janeiro

  • 1911

Greve dos estudantes do liceu Passos Manuel de Lisboa

  • 1914

Os ministros do governo de Afonso Costa deixam de comparecer no senado

  • 1915

Rumores de um golpe de estado militar

  • 1926

Greve académica a nível nacional

Fontes: aqui

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Homenagem a João Camossa, dia 26 de Janeiro



No próximo dia 26 de Janeiro, pelas 18h30, o Centro Nacional de Cultura vai fazer uma evocação à figura de João Camossa, um dos fundadores do Centro Nacional de Cultura, em 1945, e do Partido Popular Monárquico, em 1974. João Camossa foi um homem de rara integridade e carácter. Um homem ímpar, muitos me dizem! Nos últimos anos, o seu aspecto indigente e a sua introspecção e afastamento da "modernidade" foleira, que assolapa tudo, empurraram-no para um mundo de vago isolamento. Mas nem por isso perdia o génio e inteligência no discurso. E no afecto. Não era um homem simples. Nunca foi. Mas soube viver na humildade. E muito viveu da caridade. Todos o conheciam como monárquico e não menos ficavam espantados com a disparidade do discurso ante o aspecto formal, bom grado, nos seus inseparáveis sobretudos (mesmo de verão). Não era um monárquico de peruca de seda, nunca foi. Talvez por isso, nele, o contraste era um dos seus argumentos mais válidos – a sua veracidade. Ouvia-se pela sua voz.
No dia 26 de Janeiro – curiosamente 5 dias antes da comemoração do 31 de Janeiro que os Republicanos tanto gostam de recordar – o CNC vai homenagear um cidadão que fez mais pela república do que muitos dos seus pseudo-heróis. Eu conto lá estar, se Deus quiser, com algumas das pequeninas folhas que o meu querido primo João trazia sempre no bolso e gatafunhava e riscava com contas aritméticas infindáveis. O que eu tiver de escrever escreverei nos teus papeis, João, porventura algo para te dizer ou para entreter o nosso tempo. Porque o meu amor também passou a ter o tempo do teu sentimento.

Arrepiar caminho


Portugal entrou no ano do centenário da república atravessando uma das mais profundas crises económicas e as instituições do regime completamente descredibilizadas. Este não é um ano para celebrar: é um ano para repensar a Nação.

Cronologia da república - 2ªedição - 18 de Janeiro

  • 1911


Greve de trabalhadores rurais no concelho de fronteira

Devido aos protestos dos trabalhadores, uma fábrica de laníficios em Alenquer é encerrada

  • 1916

Greve dos alunos do Instituto Superior Técnico em Lisboa

A federação académica incentiva a greve geral de todas as universidades

  • 1917

É fechado o jornal "A Gazeta de Viana"

  • 1921

Greve dos tipógrafos

Protestos do operariado em Almada por falta de pão




Fontes

Cronologia da república - 18 de Janeiro

  • 1911

Greve de trabalhadores rurais no concelho de fronteira

Devido aos protestos dos trabalhadores, uma fábrica de laníficios em Alenquer é encerrada

  • 1916

Greve dos alunos do Instituto Superior Técnico em Lisboa

A federação académica incentiva a greve geral de todas as universidades

  • 1917

É fechado o jornal "A Gazeta de Viana"

  • 1919

Egas Moniz representa Portugal na conferência de Paz de Versalhes

  • 1921

Greve dos tipógrafos

Protestos do operariado em Almada por falta de pão

Fontes: aqui

domingo, 17 de janeiro de 2010

Cronologia da república - 17 de Janeiro

  • 1916

Greve de estudantes universitários no Porto e em Coimbra

  • 1918

É fechado o jornal "A resistência" de Coimbra

  • 1919

É decretado o estado de sítio no distrito de Santarém, exercendo-se a devida repressão

  • 1920

Teófilo Duarte, ex-governador de Cabo Verde é preso por razões políticas

  • 1921

É fechado o jornal "A Noite" de Lisboa

Greve dos trabalhadores dos jornais de Lisboa, com larga adesão

  • 1924

Sessão em Lisboa contra a pena de morte em que são oradores Raul Brandão, Jaime Cortesão e Câmara Reis

Fontes: aqui

sábado, 16 de janeiro de 2010

A TSF junta-se às comemorações da República

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A TSF transmite um programa radiofónico chamado "Jornal de República" aos domingos, às 10h00, com repetição à meia-noite de domingo para segunda-feira....para ouvir aqui

Cronologia da república - 16 de Janeiro

  • 1918

É promulgada a promoção de Machado Santos a vice-almirante

  • 1919

É fechado o jornal " 5 de Dezembro" de Guimarães

  • 1923

É fechado o jornal de Évora "O Alentejo"

Fontes: aqui

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Centenário da República: o Frasquinho de Veneno



"Em Bernardino Machado o interesse dominante foi a ambição da Presidência da República, garantida na submissão ao homem que lhe parecia ser o melhor fiador da realização do sonho que o acompanhara desde a hora em que alcançara situação de destaque entre os adversários da Monarquia. Para Afonso Costa era ele o penhor seguríssimo da sua omnipotência no governo da Nação desde que o elevasse à suprema magistratura política (...) Esse mau sentimento (B. Machado), e chamo-lhe mau sentimento porque se revestiu por vezes de aspectos odiosos na sua lamentável pequenez, fora-lhe sugerido principalmente pelas palavras de excepcional favor com que João Chagas me distinguira sempre, nos comícios públicos, nos seus artigos, e ainda em reuniões particulares (...) Bernardino Machado fizera uma das suas habituais intrigas para o investir (aqui, Relvas refere-se a Cunha e Costa) na representação das comissões paroquiais, certo de encontrar na sua subserviência, e na solidariedade do serventuário Ricardo Covões, espécie de factótum, e, pior ainda, de faca de mato de Bernardino Machado (...) para promover na reunião extraordinária do partido, e em actos subsequentes, situações que pusessem em cheque aqueles membros do Directório que ele queria a todo o transe expulsar"...

Memórias Políticas, José Relvas, ed. Terra Livre, Lisboa, 1977

Cronologia da república - 15 de Janeiro


  • 1911

A carbonária e os Batalhões de Voluntários da República manifestam-se contra as greves

Parada dos Batalhões de Voluntários da República

  • 1914

Greve de ferroviários com sabotagens

  • 1917

Reunião dos representantes dos jornais de Lisboa com o ministro do Interior para definir critérios na censura à imprensa

  • 1919

Greve nos caminhos de ferro

  • 1920

Greve dos funcionários dos Telefones do Porto

Assalto ao crédito público onde estavam membros do governo

Fontes: aqui

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

História instrumental



(...) trata-se de descobrir que o Pombal afinal não era um republicano liberal, que o infante D. Pedro afinal não era um progressista, que não era do MUD Juvenil. Grande descoberta! (...)*

* Rui Ramos na (indispensável) Revista Ler deste mês.

Cronologia da república - 14 de Janeiro

  • 1912

Os respectivos bispos e governandores de Coimbra e Viseu são proibidos de residir nos respectivos distritos. São confiscados os seus bens.

  • 1913

O ministério do Interior ordena aos governandores cívis para controlar as publicações do seu distrito.

  • 1914

Greve dos funcionários da CP

  • 1919

Formação de um movimento monárquico militar

  • 1920

Greve da indústria corticeira

  • 1921

É fechado o jornal "A verdade" de Viseu

  • 1922

É fechado o jornal "Ideia Nova" de Silves

Fontes: aqui

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Centenário da República. 100 anos de misérias


Poster da autoria de José Barreiros, do Blog de Leste

O principio do Cálvario da "Aurora", Janeiro de 1912

Portugal, Janeiro de 1912. A ausência do cumprimento das promessas feita pelo PRP (Partido Republicano) a par com o esvaziamento da Carbonária Portuguesa (já só se constituía como movimento anti-grevista de acção "musculada") faz aumentar a influência do movimento sindicalista por todo o País.
O Governo, já só quase exclusivamente interessado na distribuição de "poleiros" (Bernardino Machado ganha o apelido de "São Bernardino", nas ruas de Lisboa), deixa progressivamente o País entregue aos vários interesses económicos que povoam o território. Em Janeiro de 1912 dá-se o inevitável: o divórcio entre as massas operárias e a República consuma-se. O calvário da I República tem assim o seu ínicio e fim no 1º e único Governo de esquerda que existiu até à III República, o Governo de Domingues dos Santos (1924-1925), o último suspiro eleitoral da I República e o princípio do fim da aspiração a um Estado Democrático.

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Guarda Fiscal guarda as escadinhas do Duque (Lisboa) após o Governo
ter decretado a 30 de janeiro o estado de emergência,
entregando aCapital às "forças de segurança",
suspendendo as garantias e impondo o recolher obrigatório.

Em Évora a intenção do governador cívil, numa disputa entre lavradores e trabalhadores rurais (os lavradores recusam cumprir a tabela salarial previamente estabelecida e acordada com os seus assalariados) em que o governante toma o partido do patronato, leva os trabalhadores a declararem-se em greve. O chefe do distrito, para impedir que os trabalhadores reúnam, manda encerrar a sede da Associação dos Trabalhadores Rurais e ordena à G. N. R. e ao Exército que cerquem a cidade, não permitindo o acesso dos grevistas à capital.
As restantes associações operárias de Évora e de todo o distrito proclamam, em 13 de Janeiro, a Greve Geral, a que aderem mais de 20 000 trabalhadores dos dois sexos. Alarmado, o governador civil determina o encerramento das associações de classe que encabeçam a greve. Entretanto, os grevistas entram em Évora, ultrapassando as barreiras levantadas pela G. N. R. e pelo Exército, sem quaisquer incidentes. As ruas e as praças da cidade estão completamente ocupadas pelos trabalhadores. A prisão de alguns elementos mais activistas do movimento, ordenada pelo governador civil, torna a situação explosiva. A 24 de Janeiro, uma discussão entre grevistas e uma patrulha da G. N. R. provoca um morto e vários feridos. A 28, em face destes acontecimentos, a Federação Anarco-Sindicalista de Lisboa decide proclamar uma Greve Geral de solidariedade para com os trabalhadores da região de Évora.
Em Lisboa, Setúbal, Almada, Montijo e Moita a adesão à greve é quase total.
No dia 29, para evitar confrontos com as «forças da ordem, os trabalhadores recebem ordens para se concentrarem fora das zonas centrais de Lisboa; contudo, apesar das instruções, assinalam-se pequenas escaramuças com a Guarda Republicana e com a Polícia.

Na Moita, geram-se incidentes de grande violência, sendo morto o administrador do conselho. Em Lisboa, na noite de 29 e no decorrer de 30, rebentam conflitos entre militantes, a Polícia e a G. N. R., em que morrem vários grevistas e são feridos muitos outros.
O Governo, em face do deteriorar da situação, declara o «estado de sítio», «suspende as garantias constitucionais» e entrega a cidade ao Comando Militar. No dia 31, apesar de já ser conhecido o termo da «greve dos rurais», por terem sido reabertas as sedes das associações de Évora e restituídos à liberdade os activistas presos, o Exército prossegue as operações de limpeza na capital do País. Ao fim da tarde, dois Regimentos de Campanha, com artilharia, um «batalhão de voluntários», forças da GNR e da Polícia cercam a Casa Sindical (sede da Federação) e exigem a evacuação imediata do edifício, sob pena de o sujeitar ao fogo de artilharia, e a rendição de todos os que se encontram lá dentro. Os trabalhadores sitiados entregam-se sem resistência e, nessa mesma noite, mais de 600 homens e mulheres são conduzidos, sob aparatosa escolta da G.N.R. e do Exército de armas aperradas, para bordo do transporte Pêro de Alenquer e da Fragata D. Fernando, onde ficam presos nas piores condições de alojamento.

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Após o assalto à casa Sindical, forças do exército conduzem
sob prisão os manifestantes, que seriam encarcerados em
navio de guerra e no Forte de sacavém

A prova de força do movimento operário foi assim brutalmente esmagada pela intervenção das autoridades republicanas.

Monarquia e protecção da liberdade

Infelizmente, muitos dos ataques à democracia encontram fundamento exclusivo na chamada crítica realista; ou seja, nos factos, nos comportamentos e na etiologia das enfermidades de que esta forma de governo padece. Salta à evidência que as democracias são pouco expeditas, lentas, muitas vezes inoperantes, amiúde convivem com a impreparação e o amadorismo, a fulanização e o trepadorismo de gente absolutamente falha de escrúpulos. A democracia, dizem os seus inimigos inteligentes, é um insulto à desigualdade constitutiva das sociedades, é um absurdo pois impede a governação longa e avisada, tem de se render ao apetite das massas e da irracionalidade, é errática, tende a ser confiscada por demagogos e satisfaz-se com a maioria numérica. Lembram os cépticos da democracia que a esta é, em Aristóteles - nesses terríveis libelos anti-democráticos que são os livros III e VII da Política - a degenerescência da Politeia, tal como a oligarquia o é da aristocracia e a tirania da monarquia. A tradição anti-democrática tem uma história longa que se confunde com o mais profundo pensamento filosófico. Na Ética a Nicómano predica-se a justiça como finalidade da política. Se a democracia vive derrancada na busca do benefício para cada um, é, ipso facto, irreconciliável com o bem-comum da Cidade.
Contudo, se forma alguma de governo cumpre as exigências do Estagirita, essa é, contraditoriamente, a democracia. Satisfaz-nos plenamente a abordagem negativa.
- É em democracia que os cidadãos não são privados de cidadania;
- É em democracia que as constituições não são mudadas ao sabor do interesse de quem governa;
- É em democracia que o direito prevalece;
- É em democracia que a liberdade e a auto-determinação florescem;
- É em democracia que a felicidade é negociada e alcançada pelo bebate.
A democracia deve, necessariamente, ser limitada, vigiada e fiscalizada, pois a democracia transporta a pulsão totalitária a que Talmon se referia para escândalo dos democratas nas suas Origins of Totalitarian Democracy. Essa democracia messiânica, fundada na crença, comporta-se como uma tirania [benigna], mas não deixa de ser uma tirania. Ora, pelo conselho da história, verifica-se que a única forma bem sucedida de limitação dos abusos e excessos da democracia se radica na aceitação do convívio da democracia com um poder não democrático - isto é, não eleito - mas que lhe lembra aquilo que não é passível de revisão. Isto sempre aconteceu. As mono-arquias nunca existiram, senão na forma degenerada de tirania. As monarquias sempre foram abertas à participação, à representação, à oposição e não houve monarquia pré-moderna que não se submetesse ao voto, à fiscalização e às sansões legal como real.
Hoje, as monarquias ditas constitucionais (constitucionais sempre o foram na forma das constituições históricas que lembravam os limites e as obrigações do Rei) lembram ao transitório aquilo que é permanente. A democracia representa o homem; a monarquia representa a sociedade, a história, a memória que determina e alimenta a vontade dos homens viverem juntos em sociedade. A democracia exprime a volubilidade, o passageiro, o contingente; ou seja, é absolutamente humana e alimenta-se do sonho peregrino da justiça e igualdade para todos. A democracia é um admirável exercício de determinação e só há cidadãos onde estes podem, em concorrência, falar, escrever, opinar, criticar, eleger e legislar. A democracia é ruptura permanente e deve ser, sempre, disjuntiva, como as políticas o devem ser para o Estado não se afundar no ritualismo.
Por seu turno, a monarquia é um contrato longo de estabilidade, o anteparo da Política, o inculcador de comportamentos conjuntivos. Só quem ainda não compreendeu a força moral tremeda que a monarquia insufla na democracia continua a perseverar no erro trágico de a considerar inimiga da soberania popular.