quinta-feira, 15 de julho de 2010

Coisas do Centenário



Não costumo entrar em polémicas quanto a posts alheios, mas neste ano de um centenário que envergonha aqueles que o comemoram por qualquer tipo de razão - onde o preconceito e o interesse material ocupam a primeira linha -, surgem recorrentemente prosas eivadas das habituais pechas atiradas á cara daquilo que pensam ser os "pobres monárquicos" deles.

Este post do João Gonçalves, consiste num perfeito exemplo daquela propaganda surda que já é velha e relha, engendrada nos costistas tugúrios fumarentos e de acres odores, decerto mercê dos eflúvios vinháticos que acompanhavam as assassinas conspiratas que arruinaram um prometedor século. Nunca tomarei o João Gonçalves como um jacobino, porque nunca o foi, nem poderá sê-lo. Num plano infinitamente inferior, aqueles que hoje insistem em orgulhosamente reivindicar o vergonhoso labéu, não fazem a mais remota ideia de tudo o que o termo encerra na sua dimensão política e pior ainda, humana. Não é disso que se trata. Embora com alguns amistosamente prive, o João tem por regra não gostar dos monárquicos, umas vezes "porque sim", outras vezes "porque não". Temos de aceitar a excêntrica teima sem revidar no mesmo tom, até porque esta insistência na nossa universal "estupidez e pobreza de espírito", advirá do secreto reconhecimento do contrário daquilo em que insiste. É uma homenagem que o João Gonçalves não quer reconhecer ou prestar. Ele sabe que todos bem o compreendemos.

Pela leitura do Portugal dos Pequeninos, adivinhamos o dilema do J.G. Dia após dia, vergasta os seus imaginativos colegas de república, de uma forma impiedosa e jamais vista em qualquer mísero e despiciendo blog thalassa. Se hoje o sr. Cavaco é um candidato a regenerador herói de uma pátria sem remissão, amanhã o presidencial silêncio ou longa complacência diante do 1º ministro, é severamente criticado como escabrosa, oportunista e adivinhada pusilanimidade. O J.G. bem tranquilo poderá ficar e no dito cavalheiro insistir em votar, porque não se tratará de qualquer deficiência de carácter do titular da inútil e risível instituição, mas tão só de simples calculismo cumpridor de prazos eleitorais. Chame-se o homem Cavaco, Soares, Alegre, o "concorrente a porteiro da ONU" Sampaio ou até, Thomaz, o recurso à reserva mental e ao dito que afinal se pretendeu não dizer, é a trivial constância que garante o sistema. Nada mais interessa e toda a vida pública depende deste vai e vem de casos em ricas casas, bastas vezes criados à volta de uma sopinha fria e evocadora da escusável memória do venerando vencedor de Verdun. Nisto são os republicanos excelsos peritos na vigarice e levam a palma do justo vencedor antecipado.

Na verdade, os nossos esquemáticos mariannistes andam gorgulhantes com a sua má sorte. Não lhes bastando ter um representante que não passa de um apagado, desinteressante, mal relacionado e bacoco fait-divers de subúrbio e ainda por cima sucessor de uma mão cheia de sonoros e caríssimos nadas - que embora protestando, o João também é forçado a pagar até que a fatal ampulheta decida o fim da sinecura -, a "velha situação monárquica do bigode retorcido" que tão bem lhes serviu, para sempre desapareceu. Consistiu este fogo de artifício, na converseta tonitroada pela sacra aliança daquilo que de mais desprezível teve a caceteira turbamulta do sistema do 5 de Outubro, com as miasmáticas águas paradas da 2ª república. Goebbels não faria melhor. Mas factos são factos e deles não podemos alhear-nos. Não só o sucessor da Coroa significa exactamente o oposto daquilo que o João insiste em fazer crer, como entre as hostes do azul e branco se contam aos centos os filiados teimosos, com leitura e uma preparação que fazem empalidecer o conhecido currículo verde-rubro, adquirido nestas negociatas regimentais em que a república de telejornal há muito se tornou. O insulto torna-se assim gratuito e tem o esperado efeito de boomerang, pois é com um certo gáudio que os monárquicos lêem e divulgam as obras dos historiadores que J.G. tanto gosta de evocar - como Fátima Bonifácio e Rui Ramos - que nos últimos anos têm prestado um grande serviço à verdade de uma História que deliberada e despudoradamente tem sido muito mal contada.

Bem vistas as coisas, o João deveria até manifestar a sua felicidade pela Situação, uma vez que diária e descoroçoadamente confirma as escassas alterações climáticas de permanente guerra civil partidista, sem a qual o nosso bairrismo político não pode sobreviver. Eternamentee à compita pelo mata e esfola, os republicanos "de esquerda" desprezam e desrespeitam o sr. Cavaco sempre que a oportunidade surge - bastará lermos o que dele se escreve e diz -, tal como os "republicanos de direita" se desunharam ao longo de vinte anos, em espalhar notícias de negociatas de marfins, constelações de diamantes caídos em florestas jâmbicas, fundações privadas erguidas com dinheiros públicos, geracionais nepotismos vários, negócios de extinta colónia dos mares do sul da China, ou suspeitos terrenos camarários e andares de luxo em qualquer Bagatella do centro lisboeta. Neste campo do boato, qualquer taxista alfacinha, faz o pleno de uma tradição que o felizmente defunto, mas mal enterrado PRP inaugurou em Portugal. A luta política "por Bem de Belém" não pode passar sem estas pequenas e tão humanas misérias, onde luxos nababos vão alternado com calculadas modestas marquises anodizadas e assim por diante, num eterno bailinho dos pergamóides de hoje, com os veludos do amanhã.

Conheço o João Gonçalves há perto de trinta anos e gabo-lhe a coerente e comprovadamente desinteressada fidelidade à causa do Partido. Sendo um impenitente não-filiado PSD friendly - como já se definiu -, compreende-se este constante permanecer no terreno, evocando simbólicos actos de cavaleiros de outras eras, em que o putativo vencedor permanecia em campo após a refrega, atestando uma vitória. Mas afinal, trata-se de uma vitória de quem, ou mais importante ainda, de quê? Poderá o João explicar? É que ainda poucos entenderam para onde nos pretende levar.

Não tardaremos em compreender. Com Cavaco já em afanoso guignol antes do bater da hora, a desértica e presidencial campanha aproxima-se, sentando-se os "pobres monárquicos" mudos e quedos na primeira fila, mas prestos e lestos para o desfrute do espectáculo que se adivinha.

Passando adiante dos política e republicanamente despojados comentadores do ciberespaço, numa frase se lobriga aquilo que a república foi, é e jamais poderá deixar de ser. Os agentes do barrete frígio, empanturram-se de um conceito de forma que apenas será tida como boa, se o "seu" presidente estiver disponível para a partilha de feudos, lataria aposta nas lapelas dos 10 de Junho, aplicação da mobilidade em direcção a uma pública gamela, comendadorias amigas, catrapiscanço secretário em ocioso gabinete de estudo, ou assessorias anexas. É esta a limusínica república que querem e que no fundo, bem merecem. Sobretudo, é a república que ouvidos de mercador faz aos lancinantes protestos de um cada vez mais evidente Portugal dos Pequeninos. Será assim tão difícil o João reconhecer que não tem lugar entre "isto"?

Então, mais não se rale e aproveite bem o verão, desobedecendo a qualquer patético pacóvio que de arreganhada tacha lhe recomende férias dentro de portas. Se puder, parta para mais civilizado destino, talvez uma não muito longínqua, irreverente e transbordante de auto-estima Monarquia.

11 comentários:

Anónimo disse...

Comprei esse livro enganado, a estoriadora é faxiosa.

Anónimo disse...

Já mandei a minha bomba lá

Anónimo disse...

Já mandei a minha bomba lá

João Afonso Machado disse...

Caro Nuno:
Já lá fui também dizer que o livro não presta. Em 1820 não surgiram os republicanos. Surgiram os «devoristas» e recomendei a leitura de V. P. Valente.
Mas conhcendo V. há tanto tempo o JG, porque não o convence a vir até aqui discutir connosco, pobres diabos, monárquicos tontinhos, a ver se ele não terá ainda algo a aprender.

João Gonçalves disse...

Nuno. Só posso agradecer o tempo perdido a escrever tão longo quanto bem esgalhado post. Não sou friendlly de nada e, a sê-lo, de muito pouca gente. Todavia, se há coisa bem resolvida na minha tola é a opção republicana. E presidencialista. Para além das limitações pessoais ou políticas, os PR's - mesmo o desdenhado "sr. Cavaco" - são o que esta Constituição deixa que eles sejam. Sou adepto de uma Constituição como a francesa. E gosto de história. De bons livros de história. É neles que gosto de rever a nossa monarquia. Porque é lá, desde que bem escritos, que ela deve estar e ser estudada. Abraço a todos.

Anónimo disse...

A republica com 100 anos de celulite também já devia ir à Corporacion Demostética ... porque o mau aspecto sobre o ponto de vista de Marketing é péssimo. Republica presidencialista à lá francesa ? eheheheh ... arrange uma modelo para 1ª dama heheheh

João Afonso Machado disse...

João Gonçalves:
O único momento presidencialista na República portuguesa foi com Sidónio.
Gostou? Foi bom? Porque só durou uns meses?

Deve sentir-se pouco compensado: em 100 anos de República, não mais do que 1917-18 para cumprir o seu modelo presidencialista. Assim, efectivamente, é dificil encontrar livros de História que versem o tema.

Tente «O Poder e o Povo» de Pulido Valente.

Ega disse...

João Gonçalves tem razão. Nada como um bom livro de História para estudar a Monarquia.
Sobretudo porque o futuro faz parte da História, embora eu suspeite que para ele não.

Nuno Castelo-Branco disse...

Não perdi tempo algum, João, pois se respondi ao post, tal se deve ao respeito que mereces. O trabalho de informação que prestas é inigualável, gostem ou não gostem do teu posicionamento. Até me agradam estas picardias que ao longo dos anos se foram perdendo ou plastificando em palmadinhas nas costas e outras coisas bem piores. Como sabes, da polémica faz-se a a luz. A opção presidencialista é tão legítima como qualquer outra, embora no Portugal sidonista - e já com uma fraca tentativa nos tempos do Pimenta de Castro -, tenha tido um resultado que é no mínimo, discutível. Há quem pense que bem escondida na Constituição de 33, estava um presidencialismo envergonhado, como a sucessão de Salazar pareceu indiciar. Longa conversa. No entanto, creio que os problemas não advirão desta ou daquela personalidade - e neste mundo dos políticos que temos, Cavaco não é nem de longe, dos piores -, mas sim do edifício constitucional e de tudo aquilo que pressupõe: organização territorial com uma absurda miríade de coutos da partidocracia, confusas normas programáticas e também uma total discrepância entre aquilo que o Estado deveria ser e a realidade que temos. Tudo o mais talvez venha "por arrasto".

Abraço,

Nuno

* Também gosto de história e é indiferente a filiação do autor, desde que seja sério e cativante. Até é com um certo prazer em que leio obras onde a manipulação, de tão graciosamente criada, se torna arte. Por exemplo, neste momento estou a ler a 2ª GM do Gilbert. Diluviano em termos de factos, mas com uma interpretação muito parcial dos mesmos, relatando-os sem tudo dizer e que não convenha à posição britânica. Um bom escritor, sem dúvida. Isto é válido para republicanos, monárquicos, etc.
Há que ter a visão de conjunto que permita uma avaliação afastada da preferência individual. Não é fácil.

Nuno Castelo-Branco disse...

Não perdi tempo algum, João, pois se respondi ao post, tal se deve ao respeito que mereces. O trabalho de informação que prestas é inigualável, gostem ou não gostem do teu posicionamento. Até me agradam estas picardias que ao longo dos anos se foram perdendo ou plastificando em palmadinhas nas costas e outras coisas bem piores. Como sabes, da polémica faz-se a a luz. A opção presidencialista é tão legítima como qualquer outra, embora no Portugal sidonista - e já com uma fraca tentativa nos tempos do Pimenta de Castro -, tenha tido um resultado que é no mínimo, discutível. Há quem pense que bem escondida na Constituição de 33, estava um presidencialismo envergonhado, como a sucessão de Salazar pareceu indiciar. Longa conversa. No entanto, creio que os problemas não advirão desta ou daquela personalidade - e neste mundo dos políticos que temos, Cavaco não é nem de longe, dos piores -, mas sim do edifício constitucional e de tudo aquilo que pressupõe: organização territorial com uma absurda miríade de coutos da partidocracia, confusas normas programáticas e também uma total discrepância entre aquilo que o Estado deveria ser e a realidade que temos. Tudo o mais talvez venha "por arrasto".

Abraço,

Nuno

Nuno Castelo-Branco disse...

* Também gosto de história e é indiferente a filiação do autor, desde que seja sério e cativante. Até é com um certo prazer em que leio obras onde a manipulação, de tão graciosamente criada, se torna arte. Por exemplo, neste momento estou a ler a 2ª GM do Gilbert. Diluviano em termos de factos, mas com uma interpretação muito parcial dos mesmos, relatando-os sem tudo dizer e que não convenha à posição britânica. Um bom escritor, sem dúvida. Isto é válido para republicanos, monárquicos, etc.
Há que ter a visão de conjunto que permita uma avaliação afastada da preferência individual. Não é fácil.