A tomada de posse do governo de continuidade presidido por José Sócrates, trouxe poucas novidades. Na verdade, apenas a menção à república, consistiu em algo de inédito e que não mereceu qualquer comentário pelos geralmente atentos analistas políticos.
1. A questão das prioridades do investimento público. Não tenhamos qualquer tipo de ilusões quanto a isto. O 1º ministro irá insistir nos Trabalhos de Imhotep, impondo-nos o TGV, a terceira autoestrada para o Porto e o substituto da Portela. No entanto, os mais recentes dados fornecidos pelas Nações Unidas, coloca Portugal num excelente 23º lugar mundial, no que respeita a infraestruturas. Pelo contrário, o ranking nacional quanto à justiça, educação e competitividade, é desastroso. A obsessão no favorecimento do sector da construção civil, poderá ser satisfeita, se se atender à urgente reabilitação das zonas históricas das grandes cidades, onde o parque imobiliário anterior ao século XX, está vergonhosamente votado à completa ruína . Este crime deverá ser erradicado da vista de todos, em benefício do interesse geral.
Este relatório independente, da ONU, é por si próprio uma advertência - quase um indicativo para um bom programa de governo - que serve de conselho para as necessárias prioridades da acção governamental. Esperemos e aguardemos.
2. A questão da república.
Sócrates iniciou o seu discurso com um apelo aos "valores republicanos", tendo-o terminado com uma evocação ao primeiro - e possivelmente derradeiro - centenário comemorativo da subversão que o 5 de Outubro de 1910 representou.
Sabemos de fonte segura que o 1º ministro é um pragmático destes dias de contas, balanços e imediatismo mediático. Se amanhã fosse instaurada a Monarquia, Sócrates diligentemente a serviria, como regime de todas as liberdades e da independência nacional. Pouco lhe interessam aspectos filosóficos, históricos ou conceptuais e se alguém pretender aprofundar um certo tipo de questões, lá replica com o costumeiro ..."está a querer complicar?"
Pelos vistos, desta vez parece que sim. Provavelmente, José Sócrates sofre umas quantas influências doutorais de Mário Soares, exímio contador de estórias, algumas mais verídicas que outras e no caso da república de 1910, parte integral da apologética de uma situação que tendo sido escandalosa, violenta e absurda, serve de justificação para a sempre necessária ligação no tempo, a tal almejada e imprescindível continuidade que legitima.
O caso do Centenário da República, surge no momento exacto. As dificuldades que se avizinham de uma situação económica, política e social de limites ainda indefiníveis mas certamente graves, conduz à necessidade de um paliativo urgente, ou seja, a montagem do espectáculo de circo. Sem qualquer hipótese de reedição de um campeonato de futebol internacional, como mobilizar a distracção popular? Não existe dinheiro para mais uma Expo de promoção ao umbigo em torno do qual o regime gira, Portugal não venceu a Eurovisão em 2009, o Mundial da FIFA realizar-se-á na África do Sul e não consta ser possível unir patrioticamente os portugueses tal como aconteceu durante o processo que conduziu à independência da Timor.
Resta-lhes a patranha republicana. No entanto, o 1º ministro poderá ter a certeza de que anda por aí muita gente a ..."querer complicar". Num momento em que praticamente se extinguiu a geração monárquica dos pergaminhos, linhagens e heráldicas, o sistema instalado pode contar com uma feroz e radical oposição que não deixará de apresentar a verdade aos portugueses. Regime espúrio, ilegal, prepotente e violento, a república foi a forja fatal do desgraçado século XX a que este país se submeteu, tal canga por castigos imerecidos. Os monárquicos de hoje são académicos, preenchem lugares relevantes em todos os campos profissionais, têm influência e como o regime bem sabe, possuem uma audiência sem precedentes. A mentira e o reescrever de uma estória mal contada, não passarão.
A chamada ao previsível carnaval do Centenário da República, consiste num erro crasso que evidenciará ainda mais, as profundas clivagens existentes entre os próprios detentores dos mais altos cargos da dita instituição. Os tristes acontecimentos do passado 5 de Outubro de 2009 assim o demonstraram.
Sim, vamos "querer complicar". Neste aspecto, o quanto pior-melhor, serve perfeitamente e até contamos com a preciosa ajuda do residente de Belém, do 1º ministro e dos chefes da oposição. Perfeito!
1 comentário:
Excelente, não diria melhor.
Continuem!
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