terça-feira, 13 de julho de 2010

Limusinas, vaidades e corte de fitas




Uma hilariante dissertação de Cavaco Silva, na melhor tradição corta-fitas de outros tempos. Desde "atirar para um lado a bola e outros a atirar para outro", até a futebolisticamente comparar o seu papel como coordenador de selecção - que nas suas sábias palavras somos nós, os dez milhões -, Cavaco julga-se como olímpica figura que ao lado de serviçal sempre de taça de água perfumada nas mãos, nela mergulha as mãos, limpando-as de qualquer responsabilidade adquirida num passado distante ou ainda muito próximo. Cercado de amizades perigosas e comprometedoras, perora longamente diante de assembleias compostas por gente que na sua maioria, são as famosas gárgulas económicas e financeiras que tiveram a sua parte de leão na partilha dos despojos, que aqui chegaram no tempo das "vacas gordas" referidas pelo barrosão presidente da Comissão Europeia.

Pois não é assim. Cavaco está, como desde sempre esteve, em plena campanha eleitoral, servindo-se capciosamente das suas hipotéticas funções e dos recursos do Estado que diz querer defender. Podia começar por defendê-lo de si e dos seus próximos. É nítido este pendor eleiçoeiro e o chorrilho de banalidades proferidas em cada aparição presidencial, vem acirrar a convicção da imensa maioria de que tal acontece, devido precisamente ao sistema que o próprio ajudou a erguer e conservar. De flamante limusina vai chegando e aconselhando à morigeração de costumes e manias, enquanto os comprometedores silêncios, as amizades perigosas, o não querer dizer ou saber dizer, apontam apenas para a necessidade do cumprimento da vaidade pessoal, aliás confirmada a cada dia que passa. Supina nulidade, é um embaraço para os seus próprios aliados. Poderá este homem fixar-nos olhos nos olhos e apelar à compreensão e união todos, perante as tarefas que urge executar?

Tudo isto é muito mau, fazendo-nos sonhar com a passada classificação medíocre, uma mais desejável categoria a que todos já nos habituáramos.

Neste momento, não existe qualquer instituição, nem alguém que no regime consiga mobilizar a população, fazendo-a ver a necessidade de um radical virar de página que afaste o monte de térmitas que nos mina o soalho e a porta. É que os símbolos contam e muito. Como símbolo, o regime que ousa comemorar um centenário de torpezas, pouco vale, a não ser para o que deles se servem.

Olhemos para o que ontem sucedeu num país que há tanto tempo parece irremediavelmente divido. De facto, em Espanha existe uma instituição firme, inamovível e que concita a quase unanimidade. Ontem, de Vigo - a tal pretendida cidade lusíada que serve de Cavalo de Tróia -, a Sevilha, Valência, Santander, Murcia, Leão, Córdova, Ceuta, Las Palmas, Bilbau e Barcelona, as flâmulas regionais foram esquecidas e atiradas para o plano da curiosidade bairrista. Por todo o lado, um mar de bandeiras espanholas onde uma gigantesca coroa - que cada vez mais parece ocupar toda a flâmula de Espanha -, serve de símbolo que adverte os derrotados pela guerra, pela história e porque não?, pela conveniência do bem comum. Existe a convicção generalizada do sucesso que o país vizinho terá na luta contra a crise dos dinheiros e da unidade. O seu irreverente optimismo e a solidez da base constitucional são essenciais e geralmente reconhecidos.

Até nisso, Portugal está em desvantagem.

6 comentários:

João Afonso Machado disse...

Caro Nuno:
Não gaste as suas energias. Devem estar para marcar a hasta publica de Portugal (na sua universalidade de bens materiais e imateriais).
Deixe o Alegre ganhar as eleições. Assim, nesse grande dia, quando o pregoeiro estiver a puxar pelos licitantes, Alegre e Sócrates - os mais fieis retratos da República, servirão de entretainers com as suas célebres rábulas sobre a Ética republicana.

O Faroleiro disse...

Caro Nuno.

O Cavaco vai fazer o quê ? Tirar o Sócrates para meter o Coelho na cartola ? O Coelho promete acção às segundas e assina acordos de cooperação às terças !!!!

Os partidos caíram no rotativismo do Hintze Ribeiro e do José Luciano de Castro, PS e PSD são uma miragem da sua constituição, perderam matriz política e venderam-se ao caciquismo, são asilo de personagens medíocres que engordam a máquina do estado em regimes de nepotismo puro e não há muito a fazer.

Cavaco foi dos últimos da antiga geração, uma geração que pelos vistos acabou. Se esperam um Cavaco interventivo esqueçam, por duas razões :

1º é um presidente de um regime inerte, o parlamento é que manda, parlamento esse que não se entende, se querem ordem dêem ao presidente poderes para tal, como na América.

2º Cavaco sabe que o país vai mal, mas também sabe que não o salva se depuser o governo, o rotativismo não deixa margem de manobra a salvações, resta ao povo reflectir e mudar a constituição pois assim não funciona.

Caro João.

V. assim há-de ter muitos amigos...

Então quer repetir a dupla Costa/Bernardino, travestida nesses dois ? Olhe que o Costa era lente de Coimbra e esse Costa que você fala saiu-lhe o curso numa rifa, quanto ao poeta, bom não lhe conheço feito, lei ou mester que lhe faça almejar ser o mais alto dignatário dos Portugueses, mas nos tempos que correm, já desisti de ser esquisito, lá isso é verdade !

João Afonso Machado disse...

Caro Nuno:
Eu sei, e compreendo, que V. tem um eleito.
Mas V. acredita em coisas que eu dou de barato. V. tem o seu eleito.
Para mim, a caricatura mais conseguida do Regime é o tal.
O regime merece uma caricatura. Porque Portugal chegou ao fim e é urgente que os portugueses percebam porquê.

O Faroleiro disse...

Caro João.

Cabe-nos a nós de fazer o papel do Bordalo aqui no burgo.

V., como fiel aos seus princípios acredita no "pelicano" eu acredito na constituição.

Vejo Cavaco com bons olhos por duas razões; foi o melhor P. Ministro que conheci, por isso sei que é competente e sério que é coisa rara em terras jacobinas; a outra é que como crente na constituição não espero por nenhum salvador, espero sim por alguém que tenha poder para governar, sufragado e por 4 ou 5 anos, no fim julga-se.

Cavaco é figura de Estado de limitadíssimos poderes num regime inerte, como nos lembramos dele dos tempos da nova regeneração, estamos sempre à espera que ele seja P Ministro; mas ele não é. É presidente de um regime que padece do mal de ser smi; e tudo que é smi é o espelho do que nós somos; smi-democráticos; smi-europeus; smi-ricos... Se Portugal fosse na América Latina, o nosso padrão de vida até era aceitável mas estamos na Europa, e como tal ocupamos lugar de destaque à popa ou à ré, e de lá não saímos.

A não ser que se mude a constituição, aí sim, pode o meu amigo tratar os bois pelo nome e julgá-los pelo que lhes competia fazer e não fizeram.

Um abraço.

João Afonso Machado disse...

Caro Nuno: O Bordalo «fez» o Zé Povinho de olhos postos na classe politica. Não no Rei.
É sempre a mesma coisa: a fé não se discute. Ou se acredita ou não.
Para nós, o Rei é a personificação de um caminho que não tropeça de 5 em 5 anos. É o futuro sem linha de horizonte.
V. é pessoa para compreender isto. Até porque sabe se assim não for... assim não é.

Pedro de Souza-Cardoso disse...

Concordo que a constituiçao portuguesa limita em demasia o poder de um presidente da republica mas julgo nao ser por aí que se pode apoiar mais ou menos cavaco. Julgo que em mais do que uma situação cavaco esteve mal enquanto pr. nao foi conforme os seus ideais e crenças e isso para mim nao é aceitavel naquela que deve ser a 1ª figura do estado. so de per si isso demonstra, para mim, uma grande vantagem do Rei face ao pr.