segunda-feira, 26 de abril de 2010

A República de Abril


Foi, sobretudo, o recordar do saudoso "Passeio dos Alegres". Ontem, na RTP1, com Júlio Isidro no seu melhor, e uma apreciável lote de artistas então (há trinta anos) no auge das suas carreiras.
Mas "República de Abril", porquê? Por malandrice, apenas. Ou por razões de contenção de despesas, em tempos de crise. A tentar de uma cajadada acertar nos dois coelhos: as exéquias do "Centenário" e os festejos do "25/A".
O programa enfatizava o lugar da Mulher na sociedade portuguesa. Imparável, Júlio Isidro, lá teceu louvaminhas ao 5 de Outubro "libertador", para logo de seguir acrescentar: "foi preciso esperar 60 anos" para que às mulheres fosse reconhecido o estatuto de igualdade face aos homens. Já em plena República de Abril, portanto. A que emendou a mão aos lapsos e atavismos da República de Outubro e da República de Maio.
Certo, certo, é que, cada República, cada asneira. Maldizendo-se sempre, umas às outras. No programa da transacta noite esteve na berlinda a de Maio. Quase cinco décadas de República ditatorial, a que formalmente a Lei nº 1 de 25 de Abril de 1974, da Junta de Salvação Nacional pôs termo, destituindo o presidente da República e o Governo e dissolvendo a Assembleia Nacional e o Conselho de Estado.
Depois foi o que foi - dos excessos revolucionários aos actuais excessos de corrupção e inoperância. Em 1 de Maio de 1974, escrevia em Coimbra Miguel Torga:
«Colossal cortejo pelas ruas da cidade. Uma explosão gregária de alegria indutiva a desfilar diante das forças de repressão remetidas aos quarteis.
- Mais bonito do que a Raínha Santa... - dizia um popular.
Segui o caudal humano, calado, a ouvir vivas e morras, travado por não sei que incerteza, sem poder vibrar com o entusiasmo que me rodeava, na recôndita e vã esperança de ser contagiado. Há horas que são de todos. Porque não havia aquela de ser também minha? Mas não. Dentro de mim ressoava apenas uma pergunta: Em que oceano de bom senso iria desaguar aquele delírio? Que oculta e avisada abnegação estaria pronta para guiar no caminho da história a cegueira daquela confiança?»

3 comentários:

O Faroleiro disse...

"foram de facto dias inesquecíveis: ver Portugal livre, os militares nos tanques sorrindo para nós, misturarmo-nos no meio de um povo em festa e ver na rua a felicidade estampada em cada cara.[...] Viver esse Portugal livre, ver os militares a abraçar o povo e ver o povo a dar-lhes cravos[...]

A reacção especulava por todo o norte que na Rússia não havia propriedade privada, nem dinheiro a circular, nem animais domésticos, tudo tinha sido colectivizado. Coisa que nós desmentiamos firmemente.[...]

Nacionalizar a banca, os seguros e tudo mais e acabar com o poder dos monopólios e dos grandes capitalistas era a palavra de ordem. A economia entrou em nacionalizações [...] os capitalistas ou fugiram ou foram presos pelo COPCON, acusados de conspiração. Se não tinham conspirado, paciência, tivessem-no feito.

A realização de eleições livres constava do programa do MFA[...] fez-se tudo para as evitar , Cunhal chegou a tentar que o MFA concorresse como partido, disse-o publicamente a ver se a ideia pegava[...]a sua realização reduziria o PCP à sua real dimensão e influência . Quando as eleições se aproximam, o PCP dá tudo por tudo para as evitar.
O PCP acelerou toda a acção política, com o 11 de Março e a total destabilização militar[...] tinha-mos de destabilizar o país.[...] Os Portugueses votaram massivamente : 91,66% de eleitores. O PS, grande vencedor alcançou 37,9%; o PPD, 26,4; o PCP 12,5; o CDS 7,6; e o MDP 4,1.[...]

O PCP, conquistada a liberdade e a democracia, decidiu passar è revolução socialista. Para isso era essencial não deixar o país avançar para um regime democrático, nem para um estado de direito, nem para uma democracia que respeitasse os resultados eleitorais. Mário Soares foi quem melhor o entendeu e combateu, juntamente com o PPD de Sá Carneiro. Também a Igreja Católica foi decisiva, pressentindo que a liberdade religiosa corria perigo em Portugal.[...]

Só muito mais tarde, e olhando novamente para a vida em Moscovo , percebi a profunda injustiça social desta tese essencial do comunismo - que perdura ainda hoje na ideias inspiradoras de alguma esquerda socialista. Um imenso país de funcionários públicos em que o esforço e a dedicação não são compensados leva inevitavelmente ao desleixo, ao laxismo e à paralisia de uma sociedade inteira.

Zita Seabra em Foi Assim

Uns evoluem, outros... Nem por isso !

Anónimo disse...

Mais uma Isidrada?
-«O que faz falta é enganar a malta, o que faz falta...» - Todos: lá-lá~lá-lá-la´-lá-lá-lá...

M. Figueira

Filipa V.Jardim disse...

João Afonso,

Miguel Torga, o nóbel que nunca o foi. Nem talvez pudesse ser,nessa lucidez desmedida de palavras e serenos sucalcos. Não pertence a repúblicas nem a monarquias.
Só a ele próprio e, à brisa agreste, dos poetas que o entendem.