segunda-feira, 22 de março de 2010

A República e a Regionalização (I)




“A Nação Portuguesa, organizada em Estado Unitário, adopta como forma de Governo a
República, nos termos desta Constituição”.

Artigo 1.º da Constituição Política da República Portuguesa, de 21 de Agosto de 1911

Os doutrinários da República Portuguesa nunca foram a favor de uma regionalização. A própria ideia de república, colhida nos ventos ideológicos provenientes da França revolucionária, não admitia a repartição do poder.

Cidadão, cidadania, são termos que apelam à cidade, ao espaço cívico por excelência, sem que tudo o resto seja digno de intervenção. Os não cidadãos são os pagãos, que habitam um espaço vazio, rural, esterilmente político. Não há lugar para a ruralidade na república.

A Lisboa pós 1910 é um vórtice. Proclama a república ao resto do país e comunica-o ao resto do país. Nesse sentido a revolução do 5 de Outubro, com mais ou menos participação, conforme a interpretação e a reinterpretação dos documentos disponíveis, é exclusiva, ou seja não admitiu a participação de todo o país, porque o resto do país não era republicano – e isto não no sentido efectivo (o que não deixa de ser verdadeiro), mas simbólico do termo. A república fez-se a partir de liturgias cívicas muito particulares. Apelava para o mundo urbano, através dos seus agentes: advogados, caixeiros, proletários. Buiça e Costa, dois pagãos (um de Trás os Montes, outro do Alentejo), converteram-se em Lisboa à religião cívica.

O que fizeram os republicanos para regionalizar ou descentralizar? Muito pouco. A figura do Governador Civil que vinha do liberalismo passou a funcionar como uma forma de policiamento do avanço da republicanização no interior do país. O maior ataque foi ao controlo dos municípios rurais que, como se sabe, não dispunham em alguns casos de homens fiéis ao regime. O investimento da República na republicanização dos municípios foi gigantesca e nunca houve intenção de repartir o poder para governar.

O poder, em Portugal, foi sempre volátil, dependendo mais de indivíduos, do que instituições.

Onde estava o rei estava a corte, existia centralidade. Onde estavam os bispos, sobretudo depois de Trento, arvoravam-se pequenos séquitos, burocratas – aí formava-se centralidade. À falta de um mapa com circunscrições intermédias, estes pólos de atracção criavam uma descentralização política e burocrática (permitiam o acesso a escrivães, notários, etc).

A grande obra da primeira República foi esvaziar a Igreja Católica da sua influência e substituí-la por comissões cívicas para evangelizar o país com a ideia de cidadania. Mas esse trabalho não pretendia descentralizar e muito menos regionalizar, apenas substituir uma religião por outra, o Catolicismo pelo Laicismo.

Os republicanos sabiam que não podiam dividir para reinar

6 comentários:

Francisco RB disse...

Sem em monarquia, nem em república se defendeu a regionalização, a grande diferença de Portugal com outros países é que semrpe foi um Estado-Nação, em que o poder, mais ou menos centralizado, procurou regular os destinos do país, em particular articulado com o sistema municipalista.

Pedro de Souza-Cardoso disse...

Francisco RB, isso é verdade sem duvida. Mas parece-me claro que cada vez mais existe uma centralização de poder. E isso cada vez mais prejudica o desenvolvimento do País no seu todo. Cada vez mais se desenvolve determinadõs centros urbanos em deterimento de outros.
O centralismo está a chegar a um extremo insustentável.
Parece-me claro que em monarquia ou em republica a regionalização é uma necessidade cada vez mais presente no dia-a-dia da sociedade portuguesa.

Filipa V. Jardim disse...

Pedro de Souza-Cardoso,

E não tem medo que essa regionalização, venha ainda mais, multiplicar o despesismo público? Essa é uma questão...regionalização, implica mais cargos: os regionais. Mais motoristas, mais "viaturas oficiais", mais convites nas inaugurações, mais burocracia...

Pedro de Souza-Cardoso disse...

Filipa V. Jardim

A partir para uma regionalização, teria claramente que se estudar e debater o melhor modelo. Claro que nao podemos por entrar por uma situaçao que crie mais «tachos» e burocracia.
Mas isso não é a unica opção. Existem varias soluções.

Ainda assim tenho mais medo da centralização lisboeta, da desertificação do interior do País,etc etc etc. Isso sim, assusta-me verdadeiramente!

Filipa V. Jardim disse...

Pedro de Souza-Cardoso,

Esse ponto que foca da desertificaçõ do País é um facto, bem como da centralização em Lisboa.Mas, não sei se a regionalização poderia contríbuir para uma mudança benéfica.
Enquanto as fábricas e as empresas fecharem, não sei se regionalizar ou não regionalizar adianta alguma coisa.E talvez aumente a despesa pública.

templario disse...

É, no entanto, oportuno lembrar que os pioneiros do republicanismo em Portugal (o caso de José Felix Henriques Nogueira - católico devoto) defendiam o modelo de federações de municípios, numa ambição de uma Ibéria federalista, muito querida até aos nossos dias pelos maçónicos portugueses (com fortíssima influência no interior do PS, e não só), em estreita cooperação com a maçonaria castelhana.

Não concordo que a primeira República tenha morrido de amores pelo municipalismo, tal como o regime liberal saído de 1820, estes, então, ferozes inimigos do poder local municipalista.

Sou radicalmente contra a regionalização, mas não estou de acordo com os que a rejeitam por questões de Custos. Portugal é um país antiregional por razões históricas, culturais, étnicas e linguísticas. É por aqui que devemos procurar justificações para ser contra ou a favor.

A regionalização, administrativa ou autonómica, abriria caminho à concretização do desígnio castelhano de um "império doméstico".

É perfeitamente possível implementar uma Descentralização eficaz, sem a criação de perigosíssimos "Terreiros do Paço" com órgãos eleitos por sufrágio universal.

Camaradita