«É assim declarada restaurada a Monarquia (...) pelas forças da guarnição militar da cidade do Porto (...).
O Porto estava em festa. Entusiasticamente o público solta vivas a Portugal, ao Rei e à Monarquia (...). Todos assistem ao desfile das tropas pelas ruas, até ao quartel-general (...). É para aí que Paiva Couceiro se encaminhou.
Tão vasta era a multidão que o automóvel onde seguia só com dificuldade percorreu a última parte do percurso (...). nova bandeira é içada no quartel-general e repetem-se uma vez mais as manifestações monárquicas de apoio, sem desacatos, sem perseguições e na sua maioria populares, por todas as freguesias da cidade Invicta.
(...)
Em várias localidades esse acontecimento é assinalado com o hastear de bandeiras azuis e brancas nos mastros dos edificios públicos e nas casas particulares, o hino da Carta, o repicar dos sinos, procissões religiosas (...). As populações davam largas ao seu contentamento, rebentando foguetes, queimando bandeiras republicanas e, inevitávelmente, perseuindo e prendendo os democratas republicanos da terra. Convictas de que com a Monarquia seria possivel ter novamente a paz e prosperidade (...) tão necessárias a Portugal.
(...)
Também o mesmo se passou nos primeiros meses de 1919 quando no Norte se tentou recuperar o regime do trono, provando os populares, mais uma vez, a sua apatia relativamente à política, apesar de os monárquicos teimarem em dizer que o ambiente era de grande euforia e satisfação.
(...)
De facto, o Norte e os meios rurais em Portugal sempre se revelaram mais resistentes à mudança, mais conservadores e mais religiosos, sendo nítido o pedomínio dos monárquicos. Factos justificaveis (...) pelo facto de se tratarem de populações marcadas, na sua maioria, pelo analfabetismo, pela ignorância e pelo subdesenvolvimento económico.
(...)
Assim, fartos de anos de impotência política e de perseguições, os católicos de vários quadrantes que, na sua quase totalidade, tinham tendências monárquicas, logo aderiram com grande convicção a esta cruzada, pelo regresso ao regime que não os afrontava
(...)
Para percebermos a manipulação que nesses dias se sentiu no Norte do País, basta vermos quem foram aqueles que se manifestaram a favor da Monarquia. Eram, quase todos, pessoas humildes, mulheres, crianças e gente "duvidosa", que, por interesse, defendiam algo que, na maior parte das vezes, nem sequer percebiam o que se tratava.
(...)
No entanto, em qualquer dos casos, seja por interesse, por indiferença ou por receio de retaliações, a grande maioria da população do Norte dava mostras de ceder fácilmente a qualquer tipo de sistema de organização».
in Helena Moreira da Silva, «A Monarquia do Norte (A tentativa de restauração monárquica no Porto e a reacção do regime republicano - 1919)», col. Batalhas da História de Portugal, vol. 19, ed. Academia Portuguesa de História, 2006, págs. 45-59.
11 comentários:
João Afonso,
O que se deve ter passado, foi que a "ilustre historiadora", autora deste fantástico livro, deve ter frequentado e, logo, inspirado, nas festas da embaixada em Paris, para desenvolver tão sublime dissertação, nomeadamente sobre "apatia festiva". Assim se explica,igualmente,a tendência bloguistica para "sites maçudos" e de temas nada relevantes do respectivo embaixador.( o treino para a tal apatia festiva. Sim, que imagino requer bastante treino. Não é qualquer um que se pode gabar de estar "apáticamente feliz").
Enquadra-se, portanto.
Depois "adaptou-se" tudo, ao aturado estudo sobre a monarquia do norte, como se podia ter adaptado a outros estudos...calhou, foi este.
Não há mais bibliografia da senhora?
Aguardo com expectativa.
Caro amigo, parece que a autora escreveu o texto por partes, não sabia muito bem o que se passava, tive uns antepassados da zona de aveiro que se não têm fugido para Coimbra tinham sido linchados pela população "inculta", tais era o desagrado pelos actos desse meu tetraavô quanto a Igreja, o jacobinismo dele toldou-o completamente e chegou a ordenar a destruição de imagens e ornamentos religiosos... basta que teve que fugir a salto da prisão a quando da monarquia do norte.
Filipa:
de momento não disponho de mais bibliografia da Senhora. Acredito que tenha redigido o texto sob a pressão do prazo e talvez com o bom propósito de consultar fontes de todas as vertentes. O resultado, como se vê, não conseguiu ser nem analítico nem sintético.
Assim não se pôde esquivar a uma leitura mais atenta e crítica...
Francisco: este é um tema ainda hoje fracturante. Eu sigo o meu credo, respeitando os que seguem credos opostos. O mal está em que, na época, houve radicalismos e injustiças. Quem lê que conclua onde foi mais radical ou injusto. A minha preocupação é trazer à liça depoimentos de ambas as partes, precisamente para que os contemporâneos tenham meios de tirar conclusões.
Este escrito sobre a Monarquia do Norte deve ter sido escrito no 1º Abril. É uma partida.
M. Figueira
M Figueira,
Só agora é que eu percebi, veja lá. E eu que já ia na página 45...
Caro amigo, quiz ilustra apenas a situação e do lado de queme stava o povo, com um exemplo de um meu antepassado republicano.
O povo preferia (e se calhar prefere ainda hoje) a monarquia, por alguma razão os governos provisórios pretenderam criar uma espécie de cartilha de doutrinação popular.
Caro amigo, quiz ilustra apenas a situação e do lado de queme stava o povo, com um exemplo de um meu antepassado republicano.
O povo preferia (e se calhar prefere ainda hoje) a monarquia, por alguma razão os governos provisórios pretenderam criar uma espécie de cartilha de doutrinação popular.
Mais uma escriba a soldo dos "beneficiante"s de luvas e outros ornamentos braçais deste regime. Com jeitinho ainda se verá que d'algum lado virá pingue subsídio via fundação... paga pelo contribuinte. Uma questão de carta passada aos corsários do costume, caros amigos.
A bibliografia e as fontes históricas que a autora elenca no final do trabalho são bastante rigorosas. Um problema é a crítica das mesmas: foi extensa a propaganda republicana sobre a «Monarquia do Norte», a tal ponto que um aguerrido republicano a denominou «Reino da Traulitânia», sugerindo uma época de terror. Outro problema é o da historiografia portuguesa ser tendencialmente parcial e, durante os últimos 30 anos ter retomado a ideia de um movimento excêntrico. Ora bem, basta ler os jornais do Porto durante a época para perceber que a cidade conviveu relativamente bem com a governação realista, salvo, como é óbvio, focos de insurreição republicanos. Honestamente não me parece que tenha sido boa a escolha para realizar este volume das «Guerras & Campanhas Militares». A autora caiu de pára-quedas neste assunto quando outros haveria que melhor dominavam as fontes e a época. Mas tendo o convite sido atribuído pela Academia Portuguesa de História, não é caso para admirar...
Pois NR, eu estimo bastante estes "tiros no pé" ....
NR:
A bibliografia é extensa. Nem precisava de tanto. Bastava ter fé no Rocha Martins, ou na versão mais abreviada (R. M. complica muito) do Sollari Allegro (Filho).
Quanto ao Reino da Traulitânea, se a Autora tivesse lido este último com atenção não esqueceria este argumento: os «trauliteiros» mataram (dizia-se depois) muitos republicanos. Mas nunca apareceu o nome de um único morto. Está tudo dito. Até porque a República nunca abriria mão desses seus mártires. Simplesmente, eles não existiram.
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