quinta-feira, 22 de abril de 2010

Laços de família.





Uma das mais frequentes críticas à ideia de Monarquia é a questão da hereditariedade. «Se ele pode ser rei, porque é que eu também não posso sê-lo?», como se qualquer um de nós, anónimos cidadãos pudesse, efectivamente, alcançar o lugar de presidente da república. É esta ilusão de igualdade, de acesso democrático e igual, que conserva a ideologia republicana naquele pedestal de superioridade onde se acolhe uma parte dos políticos. Mas quando se trata de consolidar o poder abaixo dessa alta ideia republicana, a hereditariedade dá muito jeito. De resto, a República Portuguesa está cheia de exemplos de dinastias empresariais, políticas e profissionais. Desde os Santos Silva, e os Soares, republicanos, laicos e socialistas, até aos Azevedo ou Champalimaud, sem esquecer as pequenas clientelas familiares que preenchem as vagas das Câmaras Municipais, Secretarias de Estado, Empresas Públicas, etc, onde filhos e filhas sucedem a pais, sobrinhos a tios, etc, num nepotismo facílimo de aclarar pela leitura, ainda que fastidiosa, do Diário da República. É que a ética republicana - esse hipotético estado mental em construção - sabe que o voto é apenas uma das fases do processo de obtenção do poder. Segue-se-lhe o sangue e o dinheiro, dois factores que os políticos republicanos portugueses souberam manobrar muito bem desde o século XIX.

4 comentários:

Ega disse...

Mas essa é exactamente a essência do fervor republicano: a dinastia própria, a de cada um dos seus chefes.
Enquanto para os monárquicos a dinastia está na Familia Real, para os republicanos, a dinastia está nas suas familias. Eles são os caudilhos, os chefes absolutos e essa prerrogativa gostam de a transmitir aos filhos.
Já aqui falámos na Dinastia Soares, como o exemplo mais conseguido.
Mas há muitas outras.
Os republicanos não defendem a democracia, ao contrário do pregam. Defendem a sua tradição e o seu prestígio. E vivem e gastam à tripa-forra, sempre a chorar lágrimas de crocodilo, e a criticar a Realeza que é sempre muito mais discreta e austera do que qualquer Marocas em deslocação oficial.

Lurdes Gonçalves Pereira disse...

Muito bem observado. Em relação à ética republicana como sendo um estado mental em construção, eu iria mais longe e diria mesmo que essa ética é nada querendo ser tudo. Resvala-se a cada curva, a cada linha recta numa contínua desconstrução feita à base de contradições. Basta dizer q se arvoram em democratas, de um regime q foi implantado à custa de um duplo assassinato. E tudo foi um mar de rosas a partir de aí!
Alguém me pode aqui recomendar, por favor, um estudo sério e imparcial, sem olhares apaixonados, sb o período pós-implantação e a Monarquia do Norte? é q eu não sou formada em História...por favor, não me remetam para a História de Portugal coordenada pelo Mattoso...lol

O Jerónimo disse...

A hereditariedade é A questão central que separa as monarquias ocidentais das republicas (ocidentais). O resto é de facto circunstancial. Nos dois tipos de regime temos exemplos de bons funcionamento. Todos os conhecem.
Aliás tirando o ponto da escolha de chefe de estado, o resto da estrutura tem imensas semelhanças dado que são regimes democráticos.

Os comentários do Ega sobre a democraticidade dos republicanos são de tal forma absurdos que vou-me dispensar de os comentar.

No que diz respeito a "dinastias", gastos, mau funcionamento das instituições, etc, é preciso ser-se mais profundo e intelectualmente mais honesto. Há razões de cultura e tradição de um povo que ultrapassam os regimes. Leiam o que disseram os estrangeiros que passaram por Portugal no passado, que percebem do que estou a falar. Ou se preferirem o relato quase na 1a pessoa leiam os "Ditos portugueses dignos de memoria". Não mudámos assim tanto desde o sec. XVI. Com a riqueza que tivemos no passado podíamos ser dos países mais desenvolvidos do mundo, contudo aqui estamos.

As mudanças de regime raramente se fazem de forma absolutamente pacifica.
Não devemos esquecer que possivelmente o acontecimento mais fratricida e negro da nossa história foi a guerra civil entre liberais e absolutistas.
O assassínio de D. Carlos e D. Luís Filipe foi um acto hediondo mas a I Republica não é consequência imediata dele. Contudo é muito provável que a história tivesse sido outra se D. Carlos estivesse ainda vivo.

O acto fundador da III República é claramente o dia 25 de Abril de 1974, e os seus objectivos e concretizações são bem diferentes da I e II República. O referendo ao tipo de regime poderia ter sido feito nessa altura, mas a opção foi a legitimação na assembleia constituinte. A questão poderá vir a por-se no futuro, mas as condições para tal não estão reunidas.

De qualquer forma e por muito que custe aos actuais monárquicos (creio que na sua maior parte "duartistas" do que leio) a morte sem descendência de D. Manuel II, constituiu um sério revés para a causa monárquica. Um candidato mais forte teria mais hipóteses de ser aceite pela sociedade actual.

Nuno Castelo-Branco disse...

Em cada artigo que o dr. M. Soares dá à estampa, lá surgem menções a este que é filho daquele, a aquele que era bisneto, neto e filho d'aqueloutro, etc.