domingo, 16 de maio de 2010

Um certo mau gosto.

A começar pela bandeira verde/rubra, o regime republicano e os seus próceres apenas deitaram mão ao poder não tardaram a evangelizar o país com o mau gosto. Os gostos burgueses, o novo-riquismo que caracteriza estes 100 anos, desde os arrivistas da I República, passando pelo folclorismo do Estado Novo até aos patos-bravos cavaquistas da III República recordam-nos que a iconografia republicana apela para o kitsch (mas o kitsch mau), o garrido, o lúbrico resvalando para o maltrapilho - escória imagética a que uma certa sociedade se foi habituando como processo normal de coexistência. A prova deste flagrante menosprezo pela qualidade da arte produzida, do gosto educado e do talento aproveitado foi a forma como a caricatura serviu (e serve), não a sátira inteligente e elegante, mas a pura destruição pelo vulgar, pelo desprezível. Uma linguagem vernacular, associada a imagens licenciosas, suscitaram o desbragamento dos analfabetos assim electrizados pelas fáceis e despudorada campanhas republicanas. A prova está na imagem supra. Devemos, aliás, recordar que foi um feroz republicano, Bordalo Pinheiro, quem criou essa criatura abjecta chamada Zé Povinho que a República tão depressa acalentou como símbolo ao mesmo tempo paternalista e fóbico da maralha que controlava.

16 comentários:

O Jerónimo disse...

"A aristocracia não se mistura com o povo", ouvi recentemente da boca de um monárquico. E ainda não perceberam porque estão desligados do país real (e eternamente sem rei?).

Anónimo disse...

Não percebo a pertinência do comentário, em relação ao que foi escrito. Explique-me, por favor: o que tem a ver o mau gosto com o facto de porventura a aristocracia não se misturar com o povo. E de que aristocracia fala? Da nobilitada, de sangue, ou da de gabinete, dos comendadores republicanos e maçãos? Porque as elites existem e persistem...

Anónimo disse...

Não precisa explicar. Alguém que escolhe um nome e um blogue falso, para veicular expressões que não tem coragem para assumir com a identidade verdadeira, também não é digno de ser encarado de frente para um diálogo sério. Se é mesmo republicano, a sua existência, só por si, é a prova de como este regime não se quer sério, nem honesto. Apenas o tal coio de indigentes de que falava Almada Negreiros.

Nuno Castelo-Branco disse...

O borra-botismo não tem classes. É um estado de espírito em que este regime é exímio. Ainda há dias se viu até à exaustão. Pobres diabos...

Lurdes Gonçalves Pereira disse...

Nuno Resende,
Li atentamente o seu texto e reparo em quanta verdade o sr. toca. De facto, um assunto pertinente: o mau gosto q grassa na sociedade de hoje ( esqueceu-se de referir a imagem ridícula de certos analfabetos q se pavoneiam ao Domingo em "fato de treino" no Centro Comercial!!!).
Eu não estou habilitada para fazer uma análise sociológica deste fenómeno pois não é essa a minha formação. No entanto, julgo q qualquer um de nós mesmo não o sendo, mas q reflicta sb o assunto, chega lá: esta é uma realidade generalizada das sociedades ocidentais, monárquicas ou republicanas. Não julgo q seja exclusivo ou resultado da "ética" ( ou falta dela) republicana. Eu sou monárquica de alma e coração como costumo dizer sempre, mas neste ponto, apesar de concordar q a evolução mental e social q resulta de particularidades ideológicas do regime é propiciadora a tais desvarios, não posso contudo deixar de constatar q o mesmo se passa noutras sociedades, inclusivamente monárquicas.
Cito o exemplo da Bélgica, onde resido e q como bem sabem é monarquia. Pois basta só vos relembrar da moda das calças descaídas, a ver-se as "ceroulas". Um horror, eu ou outro comum cidadão ter de levar com a visão ( pois às vezes é inevitável mesmo)da dita peça de roupa interior íntima de um fulano qualquer! Bom essa e outras mais q não cabe aqui explanar.
Na minha modesta opinião, a democratização e massificação das sociedades prestam-se a estas consequências funestas. O que se passa no ensino, a nível da qualidade e da exigência, é outro exemplo flagrante.E q está relacionado com a mesma causa. Mas também essa é outra história que eu espero bem q um dia um de vós pegue e comente articulando com o ideal do blogue e com a qualidade a q já me habituaram ( sou fã deste blogue, aprecio imenso as vossas intervenções ).

Também não percebi porque é q o Sr. Jerónimo aplica o termo "eternamente", será q este sr. tem capacidade para ver o futuro? se não, como poderá partir do princípio q a república será ela eterna?

Cumprimentos

O Faroleiro disse...

Sr. Nuno, caro caro "homónimo", sim homónimo pois partilhamos, pelo menos eu partilho, respeitosamente de diferente opinião, e o meu nome é homónimo do seu, o verdadeiro.

Associar república com mau gosto é um exercício no mínimo tendencioso, e estampa nos seus um rótulo que os "verdadeiros" desdenham que é precisamente um certo "elitismo", de pacotilha diga-se.

Eu, republicano e humilde que sou já tive condes em casa, gente como eu, simples, simpática, agradável com quem se pode discutir; muito afastados da "parolice" que também pode ser colada a determinados monárquicos que procuram as luzes da ribalta nas revistas, essas sim de gosto e qualidade dúbia.

Bordalo Pinheiro, José Vilhena, Mario Cesariny, Luiz Pacheco, João César Monteiro são ícones da nossa cultura, loucos dirão alguns, críticos sem medo, todos perseguidos por mil e um preconceitos, mais ou menos como o seu, mas que ousaram levar avante a sua arte, cada um no seu estilo.

Eu não sou ninguém para evangelizar o próximo mas sempre aprendi que "gostos não se discutem... Lamentam-se !", mas isto não se trata de discutir um gosto, mas sim a nossa cultura.

A "gaiola aberta" do Vilhena, uma espécie de Bordalo da II república, foi um dos maiores veículos de contestação a um regime que perseguiu tanto a republicanos como a monárquicos, e é bom que nunca se calem estas vozes, o povo que decida se são más ou boas, de qualidade artística superior ou medíocre, mas o povo que decida, e no caso do Bordalo, o povo fez do seu trabalho um símbolo de contestação, de inconformismo.

Há que ver para além do boneco do Zé Povo do Bordalo, o sentido ultrapassa e em muito a tosca peça cerâmica, citando um provérbio Chinês "quando o sábio aponta para a lua, o tolo olha-lhe para a ponta do dedo."

Eu não sou reaccionário meu amigo, nem tão pouco o pretendo insultar, mas sinta o meu amigo que na rudeza das suas palavras, mesmo que não o intente, ofende muitos dos que o lêem.

PS: O Zé Povo não é símbolo da república, é símbolo de Portugal.

Anónimo disse...

Caro Sr. Nuno Bicho
«O povo fez do seu trabalho [Zé Povinho, do Bordalo] um símbolo de contestação, de inconformismo». Dificilmente. A colagem veio de cima, não foi espontânea. Bordalo viu pelos seus olhos o que achava do «povo» (com todo o etnocentrismo e chauvinismo que a palavra acarreta): um borracho gordo, débil, alarve e boçal. Se o povo se identificou/a com tal figura, com certeza colectivamente (e não acredito nestas psicoanálises colectivas, essas sim de pacotilha) então era/é o «povo» com a menor auto-estima do mundo.
Os gostos discutem-se sim. E a minha intervenção nada tem a ver com elitismos. De resto podia (e tenciono fazê-lo) contextualizar a minha intervenção com exemplos da ideologia republicana no antes e depois de 5-10-1910. A construção de um ideário abrange todas as formas e expressões artísticas, da literatura à pintura. Ou acha que é coincidência que determinados autores tenham sido banidos dos programas escolares consoante o período e o regime? E é nessa escolha, nesse virar de agulhas consoante o caminho que segue a automotora ideológica que se constrói uma sociedade nova, moldada segundo os gostos estéticos dos seus líderes. E cem anos, em que mais de metade foram de condicionamento de pensamento e de formatação mental já são suficientes para criar uma «escola estética».

O Faroleiro disse...

Caro Nuno.

A estética poderá ser discutida sim, o significado do boneco ultrapassa em muito a estética.

Bordalo retratou o povo do fim do sec. XIX e início do Sec. XX e a imagem "grosseira" do boneco pretende ser isso mesmo, uma imagem crua do que era o povo, pobre, analfabeto, manipulado, manietado e miserável.

É um retrato de dureza e miséria e ao mesmo tempo um retrato de inconformismo; o manguito é isso mesmo, um chega, chega de fome, chega de abuso, chega de rotativismo, chega de Cabrais e de Francos, e até chega de Costas, Bernardinos Machados, Antónios Josés de Almeidas, Sidónios Pais, Salazares e afins.

O povo, rude, tosco, pobre e martirizado pelo trabalho; a sátira à miséria e a representação fiel do sentimento de "basta" isso é para mim o Zé povo do Bordalo; o zé povo sou eu e muitos como eu e a figura é intemporal, o Zé Povo não é de republicanos nem monárquicos, de "canalhas" ou "talassas", o Zé Povo somos nós, são as nossas angustias e a nossa vida dura.

Veja para além da "bruta figura" do boneco meu caro, por alguma razão foi adoptado como um símbolo de Portugal.

Com os meus respeitosos cumprimentos.

Anónimo disse...

Das duas uma: ou a República já tinha muita estrada, ou o Zé Povinho afinal possuia encantos desconhecidos,
Ou então porque andaria a loiraça aos beijos ao velhote?

M. Figueira

O Jerónimo disse...

Nuno Resende
Não vou ter o mau gosto de lhe responder na mesma moeda. Isso queria dizer que o achava com nível para me poder atingir. Aliás o seu tom é equivalente ao do seu artigo, o que diz tudo.

João Afonso Machado disse...

Caro Jerónimo:
sem pôr em dúvida que tenha ouvido o que transmitiu da boca de um monárquico, creio que concorda comigo - «uma árvore não faz a floresta».
No mais: a última entrevista do rei mostra quanto Ele não está desligado do país real (desculpe o pleonasmo). Nem nós.
Mais estarão os «barões» da Finança e da política, vê-se que indiferentes ao caos a que o País chegou.
Desses, quantos são monárquicos e quantos são republicanos?
É que eles é que são os «nobres» (ou «aristocratas», vá lá). Ou não são a classe poderosa?

Anónimo disse...

«Não vou ter o mau gosto de lhe responder na mesma moeda.»
Não responde porque não pode. Caso contrário, tivesse o "Eleutério" hombridade, ao invés de se dispor a tão vil serviço, o de com nome e perfil falso veicular opiniões que não tem coragem de assumir com a sua verdadeira identidade, respondia.
Eu tenho muito gosto no meu nome e nas minhas opiniões. Não troco o desejo de as transmitir com verticalidade em nome de pseudónimos, nomes simbólicos ou anonimato.

O Jerónimo disse...

Caro J.A. Machado
Concordo consigo. Uma árvore não faz a floresta. Nem na vida real, nem nos blogs. Infelizmente há sempre quem não aceite as opiniões alheias e se exalte com as criticas. Acontece em todos os quadrantes. Continuamos em frente com um sorriso de indiferença.

João Afonso Machado disse...

Caro Jerónimo:
É bom estarmos de acordo quanto às árvores e florestas.
Respondi ao seu comentário no post «O fim das mentalidades». Se ff vá lá ver.
Ah!... Eternamente sem Rei, iso é que não. Nunca deixámos de ter rei. V. já imaginou a Igreja sem Papa? Isto também só é para quem acredita. O que nós acreditamos é que está para breve todos os portugueses vão acreditar.

Os meus cumprimentos.

João Amorim disse...

caro Nuno

Acertivo artigo. A caricatura é feita do caricaturista. O "Zé povinho" não representava o povo português. Passou a "representar", sim o povo republicano, a partir do momento em que a propaganda o elegeu e nele se reviram os bordaleiros.

Lurdes Gonçalves Pereira disse...

"O primeiro-ministro manifestou-se satisfeito pela decisão do Presidente da República de promulgar a lei sobre o casamento homossexual, um diploma que considerou «progressista e de futuro» e que ajuda a ter «um país melhor», noticia a Lusa. .......
«Foi apresentada pelo Governo para podermos ter em Portugal um país melhor, com a redução do que considero ser uma discriminação sem sentido», afirmou. "
in Portugal Diário

Após a discussão q aqui foi travada a propósito de mau gosto e republica, republica e mau gosto, aqui, nada melhor ( ou pior ) para exemplificar como anda o mau gosto dos nossos governantes republicanos do q esta afirmação de Sócrates de q o casamento "gay" vai tornar Portugal mais progressista e com um futuro melhor....
Meus senhores, eu pura e simplesmente nem sei como comentar tal frase, só sei q fiquei triste, bem triste por ver a q ponto chegou Portugal. Se isto é o q torna Portugal melhor então o q será q o tornaria pior?